O Princípio de Pareto, baseado na observação empírica da realidade, constata que (mutatis mutandis) 80% dos efeitos derivam de 20% de causas. Wilfredo Pareto constatou, por exemplo, que 80% das terras em Itália pertenciam a 20% da população; ou que apenas 20% das ervilheiras do seu jardim continham 80% das ervilhas.
Hoje sabemos empiricamente, por exemplo, que 80% das vendas de uma empresa são realizadas em cerca de 20% dos clientes. Ou que 80% das reclamações recebidas em um empresa vêm de 20% dos clientes; ou que 80% dos lucros de uma empresa têm origem em 20% dos empregados; ou que 80% das vendas de uma empresa são realizadas por apenas 20% dos vendedores.
Portanto, a diferenciação produtiva é inerente à própria realidade empiricamente verificável.
A elite progressista e igualitarista de Esquerda (passo a redundância), não nega explicitamente a realidade constatada empiricamente pelo Princípio de Pareto: estes aspirantes à elite apenas pretendem ocupar o lugar social dos privilegiados (pretendem ser eles os privilegiados, e não os que são garantidos pela Lei Natural e pelo Princípio de Pareto)— não por mérito próprio, mas por usurpação de direitos alheios; pretendem criar uma elite alternativa à existente, que se baseie, não nos méritos próprios, mas na legitimidade do uso da força bruta do Estado para o exercício de uma tirania anti-natura e puritana.
“Um direito digno desse nome não pode ser um direito que caduca quando a força bruta do Estado acaba” [Rousseau].
O que a Esquerda progressista e igualitarista pretende é a instituição e legitimação de uma força bruta do Estado que lhes garanta um estatuto de privilégio que escape à lei natural e, neste caso, ao Princípio de Pareto. São os herdeiros do narcisismo exacerbado dos puritanos do século XVII e dos gnósticos da Antiguidade Tardia: assumem, para si próprios, um estatuto divino, consideram-se (a si mesmos) uma espécie de semi-deuses.
“O gnosticismo é um sistema de crenças que nega e rejeita a estrutura da realidade, particularmente a realidade da natureza humana, e substitui-as por um mundo imaginário construído por intelectuais gnósticos e controlado por activistas gnósticos.”
— Eric Voegelin, “A Nova Ciência da Política”, 1952
Tal como aconteceu com os puritanos [principalmente os calvinistas e derivados] do século XVII, os puritanos actuais (a Esquerda progressista e igualitarista) assumem que:
1/ a imperfeição da Natureza Humana (e de todas as criações humanas) resultam de uma sociedade injusta e imperfeita [“a culpa é da sociedade”];
2/ o mundo é defeituoso e falho, mas o Homem pode torná-lo perfeito ou, pelo menos, impôr um “mundo melhor” contra, ou apesar da Natureza Humana;
3/ o puritano exige, de si mesmo, um auto-julgamento elitista e uma abnegação própria de uma religião política (ideologia);
4/ o puritano é um individualista que despreza a individualidade — na medida em que a soteriologia puritana depende ou da sua relação directa com Deus (no caso dos puritanos do século XVII), ou do seu estatuto auto-assumido de privilegiado ontológico (a auto-assumida “elite da sociedade”, cuja salvação hic et nunc, imanente e histórica, está ontologicamente garantida). O novo puritano não padece de sentimento de culpa, porque “está salvo” (soteriologia) em função da auto-assunção do seu próprio estatuto salvífico.
5/ a experiência da conversão à doutrina (à ideologia) e consequente salvação imanente (soteriologia histórica) deu — ao puritano progressista e esquerdista militante — privilégios especiais, mas exige obrigações especiais.
6/ As obrigações especiais incluem a imposição (à sociedade inteira), por parte dos puritanos, de uma nova moral que exige uma obediência política rígida, mesmo tirânica.
As leis proibicionistas, próprias dos puritanos e dos progressistas actuais, resultam da auto-presunção de superioridade moral dos puritanos (os do século XVII e os do século XXI).
No século XVII, os puritanos invocavam o Livro do Apocalipse para anunciar o fim do mundo. Os puritanos actuais, por exemplo com a profetisa Greta Thunberg e os seus milhões de acólitos, invocam a “ciência das certezas absolutas” (cientismo) para anunciar o fim dos nossos dias devido às “filhas e filhos da perdição” (a Direita).
Os puritanos [os da Antiguidade Tardia, do século XVII e do século XXI (estes últimos, os puritanos secularistas)] são predestinados, receberam os “frutos do espírito”.
O puritanismo, no seu sentido negativo, é, hoje, menos comum entre os calvinistas do que entre os progressistas esquerdistas (passo a redundância) que transportam a tradição puritana de forma inconsciente: os puritanos contemporâneos (o esquerdopatas) emulam as características emocionais e emotivas dos seus precursores do século XVII: um moralismo novo e considerado “superior” (o Wokismo que, por exemplo. legaliza o aborto generalizado de seres humanos mas proíbe as touradas), e o prazer imenso em apontar os pecados aos outros (os de quem discordam), e o amor dedicado à “caça às bruxas” (Cancel Culture).
Os puritanos progressistas e secularistas actuais têm os defeitos dos puritanos do século XVII, mas não têm as suas virtudes.