perspectivas

Domingo, 29 Agosto 2010

O eterno argumento naturalista: “A ciência ainda não sabe, mas vai saber”

O argumento naturalista essencial (naturalismo = darwinismo + ateísmo) — conforme Daniel Dennett, Richard Dawkins, Christopher Hitchens, Sam Harris, Julian Savulescu, Anthony Cashmore, Peter Singer, etc. — inclui duas noções básicas, a ver:

  • Deus não existe;
  • A ciência neopositivista ainda não sabe, mas vai saber.


De facto, é incorrecto dizer-se que “Deus existe”, porque Deus não pertence à nossa dimensão de sujeito-objecto. Deus = Englobante + Ser. Para além deste pequeno detalhe, vamos analisar o argumento naturalista.


…o naturalista transforma a lógica em obscurantismo…

Quando se pergunta, por exemplo, a um naturalista porque é que a esponja tem aproximadamente o mesmo número de genes do que o ser humano, o que pressupõe um desenho biológico e não apenas o império das forças do acaso na organização do universo, o naturalista invariavelmente responde: “a ciência ainda não sabe, mas vai saber”.

Com este argumento, o naturalista assume, em termos práticos, que a ciência nunca irá saber, a não ser que a espécie humana (ou coisa parecida) possa existir durante mais de 10^120 anos (1 seguido de 120 zeros) que é a constante cosmológica do universo calculada pelo astro-físico Alfred Gierer.

Porém, quem não admite esta contradição naturalista como sendo absolutamente lógica, é classificado de obscurantista. O naturalista transforma a lógica em obscurantismo, e a irracionalidade em lógica.

Se sabemos que o género humanóide tem 1 milhão de anos (1 seguido de 6 zeros), e que o próprio planeta Terra tem 4,5 mil milhões de anos (4,5 seguido de 9 zeros = 4,5 * 10^9), o naturalista admite implicitamente que a ciência nunca irá saber, porque mesmo um computador do tamanho de todo o universo não seria suficiente para saber.

Mas se o naturalista não for estúpido, e souber que a ciência nunca jamais irá saber, porque razão ele diz que “a ciência um dia irá saber” ?

A resposta a esta incongruência é a necessidade premente e mesmo irracional, por parte do naturalista, da afirmação da negação de Deus — não só da sua existência, mas essencialmente do seu Ser. E o naturalista assume esta contradição por razões ético-morais : a recusa da ética e moral cristãs.

Por detrás desta recusa não só da religião cristã mas também — e implicitamente — a recusa da sua ética, está aquilo que a Eric Voegelin chamou de “gnosticismo moderno”, ou o que Olavo de Carvalho chamou de “mente revolucionária” — a ideia de que, substituindo-se Deus pelo Homem, se possa assim afirmar uma supremacia totalitária de uma elite de auto-eleitos sobre o comum dos mortais. Por detrás do naturalismo, existe sempre uma religião política totalitária e escondida, que deve ser sistematicamente denunciada e combatida.

6 comentários »

  1. Bom texto.

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    Comentar por Mats — Domingo, 29 Agosto 2010 @ 4:36 pm | Responder

  2. que pressupõe um desenho biológico
    pressupõe na tua cabeça, desde quando dois livros com aproximadamente a mesma quantidade de palavras obrigatoriamente tratam do mesmo tema?

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    Comentar por ND — Segunda-feira, 30 Agosto 2010 @ 4:20 pm | Responder

    • Deixei passar este seu comentário, mas aviso já que não tenho tempo disponível para polémicas; e como não irei deixar você falar sozinho neste sítio, não garanto que futuros comentários seus sejam aprovados.

      Sobre as “palavras do mesmo tema”: Aconselho a leitura do seguinte postal

      A Vida “por acaso” não tem hipótese

      em que escrevo o seguinte:

      As leis da Física só produzem padrões regulares. O ADN (vida) requer padrões irregulares para a transmissão de informação através do código genético.

      Para usar uma analogia, a nossa língua utiliza um código (alfabeto), e se escrevermos as letras “ABC” de uma forma repetida ao longo de 1.000 páginas, teríamos um padrão regular, altamente ordenado e previsível (que são como as produzidas pelas leis da Natureza); mas se analisarmos “Os Lusíadas” verificamos um padrão irregular nas letras do alfabeto utilizadas, o que significa uma enorme quantidade de informação.

      De igual modo, o ADN utiliza o seu código (A, G, C e T) numa combinação complexa e irregular, para transmitir o seu código genético. Uma lei física produz padrões regulares e previsíveis, como a lei da gravidade produz o fluxo de agua tépida no exemplo do tubo do duche de que se falou aqui.

      Se o ADN tivesse origem baseada nesse tipo de lei física, a sequência do ADN seria simples e repetitiva (tipo ABCABC) e sem muita informação, e seria incapaz de transmitir milhões de instruções como o faz o mais simples dos organismos (o químico Michael Polanyi reconheceu este facto em 1953 – fonte: Britannica).

      Da mesma forma que a informação contida n’Os Lusíadas não foi determinada pelos químicos utilizados na tinta das penas de Luís Vaz de Camões, assim a informação do código genético (ainda que codificada num alfabeto de 4 letras) não é determinada pelos elementos químicos desse seu alfabeto.

      Como é que se pode pensar em “palavras sobre o mesmo tema”, sem se pensar em inteligência ? Pode sim senhor! — vindo de um ateu religioso.

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      Comentar por O. Braga — Segunda-feira, 30 Agosto 2010 @ 4:38 pm | Responder

  3. Foi uma boa resposta.
    Mas não é a natureza que tem que seguir uma lei física, são as leis físicas que tentam descrever a natureza.
    E por o ADN seguir lei químicas, não é obrigatório que o resultado final seja padronizado, pense em correntes marítimas/atmosféricas, derivas continentais, para todas existem leis que as tentam descrever, o resultado é algo imprevisível.
    Talvez se encontre um padrão, género fractal, no ADN em que possam apontar para um Design, por enquanto, não passam de especulações baratas.

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    Comentar por ND — Terça-feira, 31 Agosto 2010 @ 12:27 pm | Responder

    • Mas você acaba por me dar razão: a ciência não sabe nem nunca irá saber, a não ser que você esteja convencido que vai viver 10^120 anos. Sendo ateu, você não colocaria essa hipótese. Em suma: a ciência não sabe nem nunca irá saber.

      Por outro lado, você compara a vida com as correntes marítimas e com os ventos. Você não deve fazer essa comparação, colocando em equivalência coisas que não são equivalentes. É falta de prática, da sua parte; talvez umas leituras sobre a lógica ajudem.

      A vida tem uma realidade diferente da que existe, por exemplo, em uma molécula como o H2O. Você não deve misturar tudo no mesmo saco.

      A “teoria do conhecimento finística”, do biofísico Alfred Gierer, a traço grosso consta do seguinte:

      A astrofísica calculou a densidade média do universo em 1 “partícula elementar longeva individual” (PEL) ― que pode ser um electrão, um protão, um neutrão ― por cada metro cúbico.

      Considerada a dimensão do universo, o número total de PEL’s em todo o universo é de 10^80, isto é, 1 seguido de 80 zeros.

      Se multiplicarmos este número (10^80) pela idade do universo ― 20 mil milhões de anos-luz = 10^40 PEL’s que é o período mínimo de estabilidade de partículas elementares ― obtém-se o número 10^120, i.e., 1 seguido de 120 zeros.

      Este número (10^120) é a “constante cosmológica da natureza” (CCN) que significa o limite superior lógico para o trabalho de cálculo de um computador com as dimensões e a idade de todo o universo ― um computador que efectuasse cálculos sem interrupção desde o início da sua existência (desde o Big Bang) e cujos elementos constitutivos fossem PEL’s.

      Escreve Gierer:

      «Do número máximo de operações realizáveis no cosmo resulta como consequência para a teoria do conhecimento o facto de o número de passos na análise de problemas também ser, por princípio, limitado ― sejam eles passos mentais ou passos de processamento de informações através de computador. Sobretudo, é limitado, por princípio, o número das possibilidades que podem ser verificadas sucessivamente, uma a uma, para comprovar ou refutar a validade universal de uma afirmação.

      (…)

      Podem existir afirmações verdadeiras sobre a realidade física que só seriam comprováveis em mais de 10^120 operações; nós não poderíamos decidir se são verdadeiras ou não, mas tal seria possível para uma máquina supracósmica imaginável.»

      Existe, portanto, um limite superior de passos de trabalho analíticos que seriam possíveis no nosso universo e que são compatíveis com a física do cosmo. Este é o limite da ciência e da razão científica. Contudo, a Razão não se limita à “razão científica”: como escreveu Gierer, podem existir afirmações verdadeiras para lá das 10^120 operações ou do CCN.

      Para obviar à extrema dificuldade não só da utilização plena do CCN como instrumento de análise, mas também da superação do limite provável dos limites da razão filosófica ou científica, as religiões instituíram o simbolismo.

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      Comentar por O. Braga — Terça-feira, 31 Agosto 2010 @ 12:44 pm | Responder

  4. Esta tendência dos materialistas de querem explicar toda a existência humana com referência apenas às leis da natureza é tão auto-refutante que chega a ser hilariante.

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    Comentar por Mats — Quarta-feira, 1 Setembro 2010 @ 2:20 pm | Responder


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