perspectivas

Quarta-feira, 2 Julho 2008

A política é, antes de tudo, cultura

Ferreira Leite admite discriminar “casais” gay

Admiro a coragem política de Manuela Ferreira Leite. Pedro Passos Coelho, cobardemente, fugiu a uma pergunta semelhante.

Os políticos europeus em geral já vão entendendo que não se pode tratar de forma igual situações que são diferentes. Não se pode equiparar um família composta por homem e mulher, que normalmente garantem o futuro da sociedade através das crianças que nascem, com outro tipo de associações heterodoxas por mais “amor” que se reclame para legitimar a igualdade estatutária do casamento.

“Admito que esteja a fazer uma discriminação porque é uma situação que não é igual. A sociedade está organizada e tem determinado tipo de privilégios, tem determinado tipo de regalias e de medidas fiscais no sentido de promover a família”. E a seguir especificou que essas medidas eram “no sentido de que a família tem por objectivo a procriação”. Visando os chamados casamentos gay, ainda fez um acrescento. “Chame-lhe o que quiser, não lhe chame é o mesmo nome. Uma coisa é o casamento, outra é outra coisa qualquer”, disse.

Quando tratamos de forma igual situações diferentes, o casamento passa a ser tudo; e sendo tudo, passa a ser nada. Quando a instituição do casamento entra em falência na esfera dos valores sociais, quem sofre são as crianças, em primeiro lugar, e o futuro da sociedade.

Quem ganha com a desvalorização do casamento são as forças políticas radicais que defendem que as crianças devem ser tuteladas totalmente pelo Estado, retirando-se assim o papel tradicional da família na educação das crianças. O “casamento” gay é uma peça do processo de desvalorização da família como núcleo central da construção da sociedade do futuro e de primordial importância social.

O fenómeno do divórcio em massa não é argumento que se possa utilizar contra o casamento entre um homem e uma mulher. Não podemos dizer que “a instituição do casamento está falida” ao mesmo tempo que dizemos que “a instituição do casamento para gays faz todo o sentido”. Vivemos uma época em que a mulher assumiu determinados direitos e a sociedade ajusta-se a essa evolução; o excesso de divórcios tem muito a ver com essa evolução, e é de esperar que o ritmo de divórcios diminua no futuro, à medida que o homem for mudando a sua mentalidade em relação ao estatuto da mulher.

Portanto, o caminho certo será o de dar às uniões-de-facto os direitos necessários e discriminar positivamente o casamento — que só pode ser entre um homem e uma mulher — e a natalidade. Portugal precisa de uma taxa de reposição populacional de 2,1 crianças por mulher, e neste momento só tem uma taxa de 1,49 crianças por mulher. E acima de tudo, é necessário responsabilizar as famílias, dando-lhes direitos e incentivos: o Estado pode ajudar a construir o futuro de uma sociedade, mas não se pode substituir à sociedade organizada de forma privada.


Adenda: recebi o seguinte comentário:

o casamento reduzido à versão hetero e à procriação é demagogia e deixa de fora todas as famílias que não se enquadram aí. é discriminar sim, e não só para com os homossexuais.

Vou tentar explicar, para as pessoas que têm mais dificuldade em compreender:

  1. Pelo facto de existir uma percentagem de casais (entenda-se: casais=heterossexuais) que não podem ou não querem ter filhos, isso não significa que o casamento serve para não procriar. A disposição biológica geral, maioritária e natural resulta no facto de a esmagadora maioria dos casais terem, pelo menos, um filho. Por isso, existe a lei de adopção a que têm direito os casais que não podem ter filhos, exactamente porque eles são a excepção dentro da regra. A não-procriação inerente às relações homossexuais não constitui uma excepção à regra heterossexual de procriação.
  2. O conceito de “família”, sob o ponto de vista jurídico e ético, não pode ser aquilo que a gente quiser. A partir do momento em que a “família” passa a ser o que a gente quiser, abre-se uma caixa-de-pandora em que todas as concepções de família possíveis e imaginárias passam a ser “acomodadas” na sociedade, o que tornaria a sociedade ingerível.

Deu para entender, ou é preciso fazer um desenho?

3 comentários »

  1. […] 3. A minha opinião sobre o que disse a MFL está aqui. […]

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    Pingback por Estou curioso… « perspectivas — Quarta-feira, 2 Julho 2008 @ 10:32 pm | Responder

  2. Ao BE já lhe deve cheirar a sangue…

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    Comentar por Fenéco — Quinta-feira, 3 Julho 2008 @ 2:18 pm | Responder

  3. Infelizmente para MF Leite e para o partido politico que ela lidera, a comunidade gay em Portugal nao tem a memoria curta, e no dia das eleicoes, em 2009, iremos lembrar as suas declaracoes.

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    Comentar por Paulo — Terça-feira, 22 Julho 2008 @ 8:33 pm | Responder


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