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Segunda-feira, 3 Junho 2013

A ciência não obedece a critérios lógicos da mesma forma que aplicáveis à filosofia

Filed under: Ciência,filosofia — O. Braga @ 5:37 pm
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“Uma teoria para ser científica tem de ser falsificável, defende Popper. O que os cientistas fazem com as suas teorias é, pois, tentar falsificá-las, isto é, tentar mostrar que são falsas.
E se os cientistas tentarem seriamente mostrar que uma dada teoria é falsa e não o conseguirem, o que se conclui daí?

Conclui-se que a teoria é verdadeira. Certo?

Não, errado! Pode-se criticar Popper de várias coisas, mas não de cometer uma falácia tão óbvia como esta falácia do apelo à ignorância.”

Uma falácia que Popper não cometeu

A falácia de “apelo à ignorância” (ou Argumentum Ad Ignorantiam) só se verifica se o objecto da proposição ou da teoria em questão não estiver sujeito a análise científica.

Em ciência, uma teoria é verdadeira 1/ se for falsificável , 2/ sujeita a verificação e a demonstração , e 3/ até que haja uma demonstração em contrário. Por exemplo, a seguinte proposição:

“Os deuses falam grego.”

Esta proposição não é falsificável, quanto mais não seja porque nunca ninguém viu (intersubjectivamente) um deus falar, por exemplo, espanhol. Portanto, esta proposição não faz parte da análise científica, e, do ponto de vista da ciência, a teoria segundo a qual “os deuses falam grego” é falsa na medida em que não pode ser objecto da ciência.

Agora, outra proposição:

“A micro-evolução por selecção natural, e por adaptação ao meio-ambiente, ocorre nos organismos vivos.”

Esta proposição é falsificável, porque a ciência pode analisá-la e verificar, ou não, se é verdadeira ou falsa. E ao ser verdadeira, constitui um paradigma até demonstração em contrário.

Em ciência não há certeza: apenas há verdade. E a verdade existe?

Quem escreveu aquela “coisa” em epígrafe confunde “certeza”, por um lado, com “verdade científica”, por outro lado. Enquanto existir mundo e ser humano, a verdade científica estará sempre incompleta, mas não deixa de fazer parte da Verdade Total, entendida como um Todo Universal. Por exemplo, a mecânica de Newton, e apesar de Einstein e dos quanta, ainda hoje tem componentes verdadeiras – não podemos afirmar que a mecânica de Newton é totalmente falsa.

Em metáfora: a verdade científica obedece à lógica de construção de um puzzle do tamanho do universo que, depois de completo, constitui a Verdade Total. Ora, qualquer área do puzzle, mesmo que parcial mas se estiver bem montada, é também uma parte da Verdade Total. Uma parte da Verdade Total também é verdadeira.

Se considerássemos válido o raciocínio em citação, a defesa da pesquisa científica do bosão de Higgs, por exemplo, seria considerada uma falácia de “apelo à ignorância”, porque ninguém faz a mínima ideia de qual a causa verdadeira que o produz. Se uma teoria é falsificável, então não se aplica, em ciência, a falácia lógica do apelo à ignorância. Em ciência, a lógica não se aplica do mesmo modo que em filosofia.

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