perspectivas

Quarta-feira, 28 Março 2012

Sobre a crítica ao Distributismo [parte I]

Filed under: ética,economia — O. Braga @ 6:51 pm
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Este texto de crítica ao Distributismo tem várias invectivas que vou dissecar, se Deus quiser, ao longo de alguns postais, tentando uma resposta disciplinada a um texto crítico confuso e indisciplinado.


Em primeiro lugar, o texto critica o desconhecimento dos católicos distributistas em relação a Carl Menger; é desta crítica que vou falar neste postal.

Fazendo uma analogia, para que se compreenda melhor:

Assim como hoje se pretende redefinir a noção de casamento, em que o casamento passa a ser tudo e, por isso, passa a ser nada — na medida em que se transforma em uma noção meramente subjectiva —; de modo semelhante, Carl Menger e os marginalistas redefiniram a noção histórica, cultural e multi-secular de “utilidade”, através de uma radicalização feroz e furiosa dos conceitos de “útil” e de “utilidade”, em que estes dois conceitos passaram integral e totalmente para a esfera do subjectivo: o útil, segundo os marginalistas, passou a ser tudo, segundo uma subjectivação radical; e por isso, passou a ser nada do ponto de vista objectivo e societário.

Nos marginalistas [por exemplo, Carl Menger] existe muito da filosofia moral de Hume que foi também adoptada por Hayek. E a filosofia moral de Hume é, para além de céptica, essencialmente subjectivista. Hume diz que “não seria irracional que um homem preferisse a destruição do mundo, a uma esfoladela no seu dedo” [sic]. Do ponto de vista estritamente racional, ficamos sem saber por que razão seria uma coisa boa salvaguardar, a qualquer preço, a integridade física do dedo de Hume.

A verdade é que o mero facto de desejarmos uma coisa, não constitui uma razão para agir — o que é o contrário do que Hume defendia. O que é a razão para agir é a coisa desejada sob o aspecto da sua bondade [esta noção de razão para agir já vem de Aristóteles; e o marginalismo e Carl Menger diabolizou e ostracizou Aristóteles].

Não é porque uma coisa é desejada que ela é boa; mas também não é por essa coisa ser desejável que ela é boa, ou seja, uma coisa não é boa pela razão do facto de essa coisa ser susceptível de ser desejada. Pelo contrário, quando uma coisa é escolhida, é pelo aspecto da sua bondade; e a bondade não é meramente uma noção subjectiva: quando uma coisa é boa para mim, e notória e objectivamente prejudicial a outrem ou à sociedade, não podemos falar em “bondade” do meu desejo.

Por outras palavras: a nossa vontade não faz parte exclusiva das razões para agir [externalismo]; mas também não podemos dizer que as razões para considerar subjectivamente uma coisa como sendo boa, são também as razões para a querer [internalismo].

Deveríamos antes dizer que as razões para considerar que uma coisa é boa, são também as razões para a desejar, quando a desejamos. E essas razões não são exclusivamente subjectivas, porque uma ética subjectivista não é ética nenhuma. Existe uma componente objectiva da ética que o marginalismo ignorou, dissociando a ética da política e da economia.

Para Carl Menger, “é tão útil a oração para o homem santo, como é útil o crime para o homem criminoso”. Para Carl Menger, é tão legítimo que um criminoso assassine outrem, quanto é legítimo a um santo fazer as suas orações. Com Carl Menger entramos, em termos práticos, no absurdo relativista que se desenvolveu até hoje. Portanto, é neste cepticismo ético e moral Humeano, e na sua radicalização subjectivista, que reside o fundamento do marginalismo e do Neoliberalismo de Hayek.


O “útil”, na linguagem tradicional e comum — e do senso-comum — é o oposto do superficial e/ou do supérfluo, o que implica um juízo moral.

O útil, na linguagem comum e tradicional, estabelece o limite entre aquilo que é legítimo, necessário, razoável [que vem de “razão”], prático, urgente, etc., por um lado, e por outro lado, daquilo que é acessório, fantasista, frívolo, irracional, não essencial, etc.. Carl Menger e os marginalistas erradicaram esse limite estabelecido pela tradição e pelo senso-comum ao longo de milénios.

Para Carl Menger, a utilidade não significa nada mais do que a capacidade ou uma propriedade de satisfazer um desejo individual e momentâneo — seja qual for esse desejo [Hume]. Para Carl Menger, é útil tudo o que é, aqui e agora, desejável; absolutamente tudo. Por exemplo, segundo a noção de utilidade de Carl Menger, para Hitler foi útil exterminar 5 milhões de judeus; e essa utilidade, para Hitler, é valorativamente equivalente à utilidade de Madre Teresa de Calcutá em salvar e tratar centenas de milhares de leprosos.

Em suma: a crítica ao Distributismo, utilizando o marginalismo e o paradoxo do valor, parte do princípio da validade do social-darwinismo em economia. Ou seja, parte do princípio de que não existe ética em matéria económica. E portanto, é uma crítica irracional.

4 comentários »

  1. […] Sobre a crítica ao Distributismo [parte I] […]

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    Pingback por Sobre a crítica ao Distributismo [parte II] « perspectivas — Quinta-feira, 29 Março 2012 @ 1:54 pm | Responder

  2. Vem ao caso: Economics for Dummies.

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    Comentar por pedrogarciaburgales — Sexta-feira, 30 Março 2012 @ 1:27 am | Responder

  3. Ven? Risos mil!

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    Comentar por pedrogarciaburgales — Sexta-feira, 30 Março 2012 @ 1:28 am | Responder


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