perspectivas

Segunda-feira, 11 Julho 2022

Em terra de cegos, quem tem um olho é Pacheco

Filed under: Gramsci,José Pacheco Pereira,marxismo cultural — O. Braga @ 10:28 am

« O marxismo, que relativiza a moral dos outros, situa-se no plano da ética absoluta […]. Assim, a ideologia [marxista] coloca-se num trono auto-cêntrico, no lugar da Terra no sistema de Ptolomeu, no lugar do Sol no sistema de Copérnico.
Torna-se o centro de referência absoluto».

Edgar Morin (“Pour sortir du XX siècle”, 1981)


O Pacheco vê o perigo, e trata de avisar a malta (“o que faz falta, é avisar a malta”).

É uma das principais funções dos comissários políticos do regime: avisar a malta. É claro que ele [o Pacheco] vê o perigo que a esmagadora maioria dos seus compagnons de route não vê; e por isso é que ele é um dos comissários políticos do sistema (há outros, por exemplo, Daniel Oliveira).

[Segundo os comissários do sistema] o Totalitarismo de Veludo deve ter uma agenda de aplicação/implementação discreta; deve ser inteligente e preguiçoso; deve ir amarrando paulatinamente a liberdade à moda de Gramsci, mas já não à moda de Lenine.

Porém, a actual Esquerda, em geral — a que adopta os tiques da moda americana —, é míope (incluindo grandes franjas do Partido Socialista, a ala esquerda do PSD, a totalidade do Bloco de Esquerda, o PAN – Pessoas-Animais-Natureza, o LIVRE, o IL [Iniciativa Liberal], e até uma parte “moderna” do Partido Comunista): não enxerga as possíveis (ou mesmo prováveis) consequências nefastas (para a Esquerda e para o “progressismo”) do radicalismo politicamente correcto pós-modernista (ou marxista cultural).

Esta é uma das razões por que o Pacheco diz que “não existe tal coisa como ‘marxismo cultural’”: convém sempre negar que, aquilo que nos ameaça, possa existir — não por razão de uma dissonância cognitiva, mas antes por estratégia de prestidigitação no discurso político/ideológico.

O Pacheco diz que “o marxismo cultural não existe”, porque o reconhecimento público de que ele existe é dar munições à Não-esquerda, porque esse reconhecimento objectificaria a realidade política.

O que o Pacheco critica, neste momento e neste artigo, é uma certa forma radical do marxismo cultural “Made in USA”, que pode fazer com que a agenda política da Esquerda dê com os burros na água. [Segundo os comissários políticos do regime] É preciso ir com calma e devagar (como defendeu Gramsci), para não assustar a “caça” (o povo).

O Pacheco já viu que as “teorias identitárias” (um marxismo cultural mais radical, ou o chamado “Interseccionalismo”, na esteira ideológica do Homem Unidimensional de Herbert Marcuse), irá inexoravelmente arrebentar com a Esquerda: a atomização da sociedade que a Esquerda actual defende, a imigração em massa defendida pela Esquerda que pretende [claramente] destruir a coesão social (dividir para reinar), a celebração cultural do modus vivendi LGBTQPBBQ+ (não se trata de “tolerância”: o que se pretende é celebração cultural unanimista dos “direitos de braguilha”) que condiciona ou mesmo retira as defesas naturais de uma dada sociedade; e a anomia conduzida por esta nova Esquerda marxista cultural radical cunhada em Manhattan — como escreveu G. K. Chesterton:

“FOR the next great heresy is going to be simply an attack on morality; and especially on sexual morality. And it is coming, “not” from a few Socialists surviving from the Fabian Society, but from the living exultant energy of the rich resolved to enjoy themselves at last, with neither Popery not Puritanism not Socialism to hold them back….The madness of tomorrow is “not” in Moscow, but much more in Manhattan.”

→ G. K. Chesterton: ‘The Next Heresy,’ in “G.K.’s Weekly”, 19 de Junho de 1926.

O Pacheco sabe (ao contrário da maioria do esquerdalho, que não sabe) que a impossibilidade de prever o futuro histórico prende-se essencialmente com os fenómenos de retroacção das ideias-força (ideológicas) que podem conduzir a um resultado totalmente contrário ao da intenção original, e liga-se a uma certa “ecologia das ideias”, em que os sistemas de ideias funcionam como uma espécie de ecossistemas, que influenciam mas não determinam a cultura antropológica.

O Pacheco sabe disto. E por isso é que ele nega que o marxismo cultural exista, por um lado, e por outro lado, só agora ele vem a terreiro criticar a estratégia [que já tem décadas) desta nova Esquerda marxista cultural — a de Marcuse e de Wilhelm Reich.

Em terra de cegos, quem tem um olho é Pacheco.

JPP-ZAROLHO

1 Comentário »

  1. […] Em terra de cegos, quem tem um olho é Pacheco […]

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