perspectivas

Quarta-feira, 31 Março 2021

A filosofia continua agarrada ao passado epistemológico, por pura conveniência egológica dos “filósofos”

Filed under: filosofia,Kant — O. Braga @ 10:08 pm

Eu entendo por que razão o ensino da filosofia continua a fazer, de Kant ou de Russell, paradigmas que orientam a mundividência intelectual. Mas a verdade é que Kant e Russell estão (em grande parte) obsoletos, porque o primeiro viveu antes de Einstein, e o segundo assumiu claramente que a teoria dos quanta era “coisa de malucos”.

Para um empiricista radical como era Russell, a teoria dos quanta não passava disso mesmo: uma teoria.

Escreve-se aqui, no Porta da Loja:

“É aqui que se explica a ideia de Kant sobre a existência de Deus, arrasando toda a tentativa intelectual de comprovar a Sua existência e reservando para a Crítica da Razão Prática os motivos pelos quais acredita que são diversos.”


Aconselho a leitura de uma série de apostilas:


A fenomenologia (Husserl) surgiu também depois de Kant e foi literalmente ignorada por Russell.

Partindo da noção medieval de “intencionalidade” (Brentano), segundo a qual “a consciência psicológica nunca está vazia e é sempre consciência de alguma coisa exterior a si”, Husserl estabeleceu que a consciência lógica não age a partir de dados empíricos, mas antes a partir de certas “essências” ou “objectos ideais”.

Por exemplo: se segurarmos esta mão cheia de fósforos, não podemos imaginar “claramente” os quarenta fósforos que ela contém, pois que nos servimos correntemente do número 40. Transpondo os “objectos ideais” para a lógica, Husserl infere que a consciência, munida de intencionalidade, abarca e cativa esses “objectos ideais”.


A ideia segundo a qual “Deus existe” é obsoleta; desde Karl Jaspers que sabemos isso. Deus não “existe” da mesma maneira ou forma que existe uma pedra, o meu vizinho ou o presidente da república.

“Existência é algo que nunca se tornará um objecto, é a origem, a partir da qual eu penso e actuo — existência é aquilo que apenas posso ser, mas que não posso ver ou saber”.

(Karl Jaspers, Von der Wahrheit, 1958).

Existência não significa um simples existir, mas sim uma categoria contraposta aos objectos.

A existência não é uma coisa do mundo, se se entende por mundo os objectos que nos rodeiam. Para a razão humana, a existência é um domínio que ela não pode alcançar através do pensamento, e que permanece totalmente remoto. A razão não encontra nada na procura da existência. A existência escapa ao pensamento que transforma tudo o que apanha em uma qualquer coisa objectiva. Tal como o ser humano não pode alcançar a sua própria sombra, o pensamento não pode alcançar a existência daquele que pensa.

Do ponto de vista do pensamento objectivo, a existência é um Nada da perspectiva do ser humano vivo, é a raiz absolutamente indubitável da qual o seu estar nasce a cada segundo.

Dizer que “Deus existe” é apenas uma força de expressão. Mas para Kant, a “existência de Deus” era um fenómeno literal, era uma “personagem” que existia em coadjuvação com o universo.


“É nesta parte que Russell escreve que Kant entende que a lei moral exige justiça i.e. felicidade proporcional à virtude e por isso só a Providência o poderá garantir. E é também aqui que se explica o conceito de imperativo categórico”.

¿Por que razão “a lei moral exige justiça”?! E que “justiça”? O que é a “justiça”?

Nem Russell nem Kant dizem por quê. Kant e Russell partem de um postulado, segundo o qual “a lei moral exige justiça”. Mas, por exemplo, para Hitler, a lei moral não exigia o mesmo tipo de “justiça” advogado por Kant e Russell. Este argumento de Russell e de Kant é muito fraco.

Ademais, o imperativo categórico pode ser explicado, grosso modo, da seguinte forma: segundo Kant, não é permitido mentir, por exemplo, porque a mentira considerada como uma lei geral — “todos podem mentir” — significaria o fim de qualquer comunicação humana.

Se o meu comportamento se orientasse por uma norma que me permitisse mentir sempre que quisesse, então todos os outros seres humanos teriam o mesmo direito de o fazer. No entanto, se todos podem mentir, não se acredita em ninguém e nenhum mentiroso alcança o seu objectivo.

Até aqui, Kant está correcto. Aplicada a todos os seres humanos de uma forma consequente, a máxima da mentira permitida, anula-se a si própria.

Porém, eu não sou — de modo algum — inconsequente se prefiro que os outros sigam as regras que eu próprio não gostaria de seguir. Se eu minto sempre que me apetece, mas desejo que todos os outros digam sempre a verdade, na minha qualidade de grande oportunista, sou, em certa medida, perfeitamente consequente com a aplicação do imperativo categórico de Kant.

1 Comentário »

  1. O sr. teria algum artigo para indicar àquela gente que aparece na grande mídia dizendo que “a ciência diz” isso e aquilo outro, como se a ciência fosse um ser personalizado, que emite opiniões.

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    Comentar por Denis Camursa — Quinta-feira, 1 Abril 2021 @ 4:31 pm | Responder


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