Em aditamento ao verbete anterior sobre este mesmo tema , constatamos que Kant reduziu a metafísica à axiomática, quando definiu a metafísica como “nada mais que uma filosofia sobre os primeiros fundamentos do nosso conhecimento” . Esta definição negava a metafísica medieval ou escolástica que possuía um cariz místico e/ou religioso, e, na maior parte dos casos, na Idade Média a metafísica apontava para uma realidade transcendente (não confundir com o conceito de “transcendental” de Kant, que era, de facto, imanente) à condição humana.
O prémio Nobel da Física, Wolfgang Pauli (*), volta ao misticismo da metafísica da Idade Média:
«O leigo pensa habitualmente que, quando diz “realidade”, fala de algo que é conhecido de forma evidente, enquanto a mim me parece que a tarefa mais importante e mais difícil do nosso tempo consiste em trabalhar na elaboração de uma nova concepção da realidade. É isto que tenho em mente quando sublinho sempre que a ciência e a religião têm de ter alguma coisa a ver uma com a outra.»
O prémio Nobel da Física, Erwin Schrödinger, parecia falar como o monge medieval Mestre Eckhart:
«O mundo observado é apenas uma aparência; na realidade, nem sequer existe. A filosofia dos Vedas tentou ilustrar este seu dogma fundamental através de várias metáforas.»
O físico alemão Hans-Peter Dürr, felizmente ainda vivo, justifica a relação estreita entre a metafísica e a religião:
«A Física e a transcendência designam apenas domínios diferentes da mesma realidade, que vão da camada mais baixa, onde ainda nos é possível objectivar completamente, até uma camada superior, na qual a visão se abre para as partes do mundo sobre as quais só se pode falar em metáforas.»
Poderia passar aqui muito mais tempo a citar físicos do século XX, como por exemplo Louis deBroglie, Max Born, Eddington, David Bohm, Fritjof Capra, Max Planck, Albert Einstein, e muitos outros, que se expressaram de uma forma tal que colocam em causa o conceito kantiano de metafísica. Werner Heisenberg afirmou o seguinte:
«A teoria quântica é um exemplo maravilhoso de que podemos ter entendido os factos com toda a clareza e, apesar disso, ao mesmo tempo, sabemos que só podemos falar sobre eles através de imagens e metáforas. Sabemos que, na religião, se trata necessariamente de uma linguagem em imagens e metáforas que podem representar precisamente aquilo que se pretende dizer. E, neste ponto, o meu conceito de verdade tem ligação com aquilo que as religiões pretendem dizer. Penso que é possível pensar muito melhor todos estes nexos desde que se entendeu a teoria quântica.»
Estamos já muito longe da noção kantiana de metafísica como “nada mais que uma filosofia sobre os primeiros fundamentos do nosso conhecimento”. Segundo estes cientistas actuais e actualizados, ciência e religião entroncam na metafísica. E, no entanto, o mundo ainda não compreendeu a importância desta nova descoberta em relação à realidade: continuamos a ter uma classe política que vive ainda no tempo do Iluminismo, uma comunidade científica que recusa reconhecer publicamente o óbvio muitas vezes por receio da política, um Direito Positivo que continua a negar a importância da lei natural na feitura das leis, partidos políticos que fazem do Positivismo o alicerce da sua ideologia, intelectuais que falam de tudo menos desta nova realidade como o diabo foge da cruz, em suma, andam as elites todas com as respectivas cabeças enfiadas na areia como avestruzes.