perspectivas

Quinta-feira, 16 Junho 2016

O problema é o de que uma fobia não é uma convicção

 

Uma fobia, por definição, não é racionalizada; uma “fobia racionalizada” é uma contradição em termos.

A fobia pertence ao domínio da emoção, e não ao da razão. Por exemplo, uma pessoa que sofre de aracnofobia, pode até ter consciência da sua fobia, mas não consegue lidar com ela de forma racional (não a consegue racionalizar). A fobia é irracional; e por isso não é uma convicção — porque uma “convicção” é mais do que uma simples crença: é uma crença que passou pelo crivo da razão.

O conceito de “homofobia”, não passa de isso mesmo: um conceito alargado; não existe uma definição clara e concisa de “homofobia”. Homofobia é pau para toda a colher. Em princípio, a homofobia deveria ser o “medo em relação a homossexuais”, e pertenceria ao domínio da emoção.

Um homófobo, porque actua no âmbito da emoção, nunca planearia de uma forma cerebral o assassínio de centenas de pessoas.

terror-franca-20anosO planeamento do morticínio da cidade de Orlando foi racional. Um homófobo pode matar o seu parceiro sexual, em um momento de exaltação emocional; mas porque aquele actua às ordens da emoção, é improvável que ele arquitecte um assassínio em massa que necessita de um cérebro frio e calculista.

O mais que podemos dizer do morticínio da cidade de Orlando é que ele foi perpetrado por um sociopata; mas, como dizia Napoleão, “não atribuamos à sociopatia o que pode ser justificado pela malícia”. E a malícia, neste caso, é determinada por uma determinada ideologia.

Hannah Arendt definiu “ideologia política” como “a lógica de uma ideia” que contém três elementos de natureza totalitária: 1/ a pretensão de explicar tudo; 2/ dentro desta pretensão, está a capacidade de se afastar de toda a experiência; 3/ a capacidade de construir raciocínios lógicos e coerentes que permitem crer em uma realidade fictícia a partir dos resultados esperados por via desses raciocínios — e não a partir da experiência.

A ideologia que determinou o morticínio da cidade de Orlando e muitos outros, é o Islamismo. Eu penso que o Islamismo deveria ser proibido na nossa sociedade, por ser uma ideologia que atenta contra a liberdade básica dos cidadãos.

Mas, para a Esquerda, reconhecer que o Islamismo é totalitário, seria fatal — porque seria reconhecer publicamente que a sua própria ideologia também é totalitária. Para a Esquerda, as ideologias têm que ser salvaguardadas: para a Esquerda, é uma questão de vida ou de morte.

Quando a Esquerda recorre à psicologia (que é subjectiva por excelência) para justificar factos humanos objectivos, entramos em terreno pantanoso. Em ciência, devemos procurar as soluções mais simples e evitar complicar ainda mais aquilo que, já de si, é complicado. obama-islam-web

Sexta-feira, 15 Novembro 2013

Mas de que “direita” se está a falar?!

 

Este texto chamou-me à atenção (o que é excepcional, vindo daquele blogue).

O problema da Esquerda é um problema prático: “tirar as pedras do caminho”, por assim dizer. O problema prático caracteriza-se pela tentativa de fazer com que uma coisa que não é, passe a ser: é “tirar as pedras do caminho”. E aquilo a que o escriba chama de “teorias” e “doutrinas” da Esquerda, não são teorias ou doutrinas na verdadeira acepção dos termos: antes, são justificações (a posteriori) para a acção política que decorre do problema prático que tende a “tirar as pedras do caminho”.

As teorias e doutrinas, propriamente ditas, decorrem de problemas teóricos; e o problema teórico é absolutamente irredutível ao problema prático1. O problema teórico é aquele que pretende fazer que uma coisa que é, passe a não ser — o que, devido à natural insuficiência do intelecto humano, causa irritação. E a única forma de se harmonizar, de certa maneira, o problema teórico com o problema prático, não é através da política, mas antes é seguindo a montante da política e entrar na metafísica, primeiro, e depois e em consequência, na ética; e só depois vem e se deduz a política! E quem faz este exercício de aproximação do problema teórico ao problema prático é a Direita propriamente dita. Sublinho: propriamente dita.

O João Vilela e a Helena Matos são vergônteas da mesma cepa. São “irmãos” desavindos. São ambos produtos do movimento revolucionário e da revolução burguesa de 1789; divergiram a partir de um mesmo ponto, bem delimitado pela História. Para os dois, é o problema prático que é importante: a diferença é que o João confunde o problema prático com o problema teórico, ao passo que a Helena Matos não o faz. E a razão por que o João faz essa confusão é a de que a Esquerda julga-se intelectualmente superior à chamada “direita utilitária” (“presunção e água benta, cada um toma a que quer”).

Se fosse verdade que a Esquerda se preocupasse com o problema teórico — metafísico, e depois ético, para a seguir entroncar na política —, não teríamos tido a monstruosidade ontológica das centenas de milhões de mortos causados pelo movimento revolucionário só no século XX! E muitas dezenas de milhões desses mortos foram pessoas inocentes, velhos, mulheres e crianças. Mas quem ouvir o João discorrer sobre as “teorias” e as “doutrinas” (que nada mais são do que retórica de justificação de um determinado método de acção política e de uma visão teleológica do ser humano), até parece que o século XX nunca existiu.

Havia uma outra Direita que penso que já desapareceu da Europa: a democracia-cristã.

Essa era a Direita do problema teórico que fazia a aproximação à política através da metafísica e da ética. Hoje, temos uma outra direita que, à semelhança da Esquerda, só se preocupa em “tirar as pedras do caminho”.

1. Ortega y Gasset

Quinta-feira, 7 Julho 2011

Seguindo o rasto ideológico do multiculturalismo

Filed under: ética,cultura,filosofia — O. Braga @ 12:23 pm
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As ideologias políticas são como as bactérias e os vírus: operam mutações para contrariar o antibiótico da verdade.

Por isso, por vezes, torna-se muito difícil seguir a evolução das ideias políticas, porque o que elas fazem é tentar fugir às suas próprias contradições — o que é manifestamente impossível: é impossível determinar, sequer, as possíveis contradições que uma teoria possa ter, e por isso não é possível fugir aquilo que sabemos que existe mas que não conhecemos em detalhe.
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Sábado, 26 Junho 2010

Temos que ser “especialistas da curiosidade não especializada”

Eu sigo a blogosfera porque me interessa saber de ideias. Naturalmente que se tiver a oportunidade de conhecer as pessoas que escrevem, melhor seria; mas não tendo o ensejo de as conhecer, bastam-me as ideias. Porém, não deixo de ficar aturdido com esta estória.
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Segunda-feira, 4 Janeiro 2010

A moral relativista das religiões políticas

« Uma ideologia tende a remeter para a periferia, isto é, considerar secundário, qualquer dado cuja existência deva admitir, mas de que não posa conceber o sentido, a não ser que ela própria se ponha em causa. Assim, se em dado momento a ideologia comunista tiver que reconhecer a existência dos Gulag, este parecerá como um fenómeno não necessário, mas contingente (relacionado com os avatares históricos, com o atraso da Rússia, com o cerco capitalista), não principal (pois o principal é globalmente positivo), mas secundário. A partir daí, tendo em conta que “se não fazem omeletas sem partir ovos”, as sombras não devem ocultar a luz, a árvore não deve esconder a floresta e é escusado deitar o bebé fora com a água do banho.

O notável, então, é que a ideologia se bate em dois campos diferentes, com dois pesos e duas medidas. As mesmas prisões, as mesmas proibições e as mesmas interdições que são crimes nos outros (capitalistas e imperialistas) são “erros” e “imperícias” no seu caso. É um erro prender os dissidentes, é um erro meter os opositores em campos; mas Pinochet e os fascistas, esses, cometem crimes praticando os mesmos actos.

O paralelismo objectivo entre os sistemas nazi e estalinista é evidente: campos de concentração, partido único, julgamentos deturpados, proibição da arte “decadente”, censura generalizada (com acentuação muito maior da censura literária, artística e filosófica na URSS). Mas enquanto os mesmos actos, por parte dos nazis, constituem um mal absoluto, por parte dos estalinistas não passam de males relativos. Os crimes nazis são imprescritíveis, eternos; os crimes estalinistas são esquecidos, os seus autores vivem em paz, ninguém exige investigação, procedimento… Melhor ainda: a “moral”, do ponto de vista marxista, é uma mistificação idealista se se indigna com os excessos revolucionários.

Mas o marxismo que relativiza a moral dos outros situa-se no plano da ética absoluta quando denuncia os crimes capitalistas e imperialistas. Assim, a ideologia coloca-se num trono autocêntrico, no lugar da Terra no sistema de Ptolomeu, no lugar do Sol no sistema de Copérnico. Torna-se o centro de referência absoluto. »

— Edgar Morin (“Pour sortir du XX siècle”, 1981)


A “ideologia” a que se refere Morin é a religião política. Morin, na sua condição de ex-marxista e gnóstico, tem dificuldade em associar a ideologia à religião política.

Terça-feira, 10 Março 2009

Confusão ideológica

Filed under: cultura,Política — O. Braga @ 3:08 pm
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Há quem diga que “as ideologias acabaram” com a queda do muro de Berlim; não sei como se pode ser tão estúpido ao ponto de se afirmar uma coisa dessas, tanto que a ideologia neoliberal nunca esteve tão activa como a partir do fim da década de 80 do século XX.

Contudo, é evidente que tanto as elites intelectuais como o povo andam confusos, porque as ideologias parece terem seguido uma lógica hegeliana de síntese dialéctica, e perante os sincretismos que definem as novas Teses, ficamos sem saber muito bem quais são as novas Antíteses. Sobretudo, ficamos sem saber muito bem o que existe realmente de novo a nível ideológico, porque parece que existe um esforço de recuperação revivalista de Teses passadas que se entrosam noutras velhas teorias, assumindo novas sínteses e sincretismos que raiam, mais uma vez, o absurdo e a irracionalidade.

Há quem diga que o Ambientalismo é uma nova Tese ideológica. Depende do que chamamos de “novo”: Rousseau foi um ambientalista essencial. Não vejo nada de novo. Os “Verdes” surgiram do movimento estudantil de Maio de 1968 ― já lá vão 40 anos. Onde está a novidade? A única coisa que eu vejo de novo são as velhas Teses redesenhadas através de sincretismos absurdos, e cujas Antíteses se recusam a se assumir como tais porque já fizeram a sua história.

Por isso, o que há realmente de novo é o facto de as ideologias não terem acabado; continuam essencialmente as mesmas, travestidas em novos rituais: alteraram-se a linguagem e os signos para se continuar a dizer exactamente a mesma coisa. A dialéctica continua a mesma de sempre: a que confronta a liberdade com a tirania.

Segunda-feira, 9 Março 2009

O “mercado das teorias”

Filed under: cultura — O. Braga @ 3:27 pm
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A partir da revolução burguesa de 1789 em Paris, a Europa e o mundo passaram a viver numa lógica de mercado, e submetida a ela ficaram também as ideias e as teorias, sejam estas científicas, políticas, religiosas ou outras. Filósofos, políticos, cientistas e religiosos passaram desde então a vender as suas ideias no “mercado das teorias”, da mesma maneira que o agricultor vai ao bazar vender o produto da sua sementeira do ano.

A lógica do mercado é simples: as coisas valem aquilo que no bazar se dá por elas. No “mercado das teorias”, estas também só valem o que se dá por elas, independentemente do seu valor intrínseco.
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Domingo, 27 Julho 2008

Citação

«Há três espécies de entidades/grupos que estão na origem de todo o tipo de campanhas a nível global, mesmo as mais vis, todas com a mesma finalidade, a destruição das sociedades e das famílias: os dirigentes das seitas mundiais que as programam (e que são os verdadeiramente diabólicos); os oportunistas que as implementam localmente a mando dos primeiros (que são os governantes e os que com eles colaboram) e os que as disseminam (jornalistas, artistas, comentaristas, articulistas, artistas, escritores, sociólogos, politólogos, etc., a mando dos segundos), estes dois grupos fazem-no exclusivamente por dinheiro, mas exercem forte influência junto da opinião pública que neles confia; e os inocentes (as camadas mais humildes das populações, que é a maioria das gentes dos países) que acreditam religiosamente nos dois primeiros grupos e actuam por mimetismo.»

Este trecho não é da autoria de Slavoj Zizek, mas poderia ter sido escrito por ele.

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