“Só devemos consagrar-nos a causas que a derrota deixaria intactas. Só de causas perdidas se pode ser partidário irrestrito.” — Nicolás Gómez Dávila
1/ Neste texto, Frei Bento Domingues começa por constar o óbvio: ao longo da história e pré-história humanas, sempre houve diversas estruturas de família. Por exemplo, ainda hoje existe a poligenia entre os muçulmanos (vulgo “poligamia”), e entre os tobriandeses ainda hoje existe a família “avuncular”, em que o irmão mais velho da mãe de uma criança tem um lugar mais importante na família do que o pai. Nestas sociedades, a lei do grupo é predominante; as funções, códigos e estatutos estão em primeiro plano. O indivíduo apaga-se diante dos sistemas que o clã, a tribo ou a família formam. As relações são nitidamente menos individualizadas, menos personalizadas.
Portanto, é um facto que existem e existiram sempre vários tipos de família. Aqui, o Frei Bento Domingues diz a verdade, mas não diz toda a verdade, porque eu tive que adicionar as características de outros tipos de família que ele escamoteou talvez por falta de espaço.
“O clero progressista não decepciona nunca o aficionado do ridículo” — Nicolás Gómez Dávila
2/ Numa família tipo como a portuguesa, onde a dimensão afectiva é central, a relação de cada um com a sua identidade pessoal tem um lugar fulcral: é a pessoa toda, na sua dimensão corporal, afectiva e espiritual que está comprometida nas relações. Diz o povo que “não podemos ter sol na eira e chuva no nabal”, ou seja, não podemos tirar vantagem do facto de as relações serem individualizadas e, simultaneamente, procurar referências de maneira superficial e fragmentária em sociedades absolutamente diferentes, onde a codificação social é predominante e muito restrita.
Portanto, a ideia de Frei Bento Domingues segundo a qual “há vários tipos de família” é pura retórica. Mas é retórica perigosa porque ele procura, em minha opinião, propositadamente enganar os tolos — como aliás o faz sistematicamente o “curandeiro da RDP” de onde fui respigar o texto do Frei Bento Domingues.
“Apenas porque ordenou amar os homens, o clero moderno não se resigna a crer na divindade de Jesus; quando, em verdade, é somente porque cremos na divindade de Cristo que nos resignamos a amá-los” — Nicolás Gómez Dávila
3/ em função do que já foi escrito aqui e acima, não devemos (no sentido da lógica e da ética) dizer que a realidade social (ou a realidade das relações sociais), por ser exactamente tal como é, não se deve discutir e deve ser aceite — que é o que Frei Bento Domingues defende. Perante uma determinada cultura de relacionamentos sociais, Frei Bento Domingues pede à Igreja Católica que soçobre e aceite o “facto consumado”. É exactamente isto que o Frei Bento Domingues defende no seu texto.
“Antes, a Igreja Católica absolvia os pecadores; hoje, absolve os pecados” — Nicolás Gómez Dávila
O arquétipo mental de Frei Bento Domingues é transcrito a partir da Nova Teologia e principalmente de Rudolfo Bultmann, e consiste basicamente em separar a fé, por um lado, de todo e qualquer elemento cosmológico ou mítico, por outro lado. A Nova Teologia, tal como o Frei Bento Domingues, é imanente e situa-se em um determinado espírito do tempo que é o nosso.
E, nessa defesa da aceitação do facto consumado, Frei Bento Domingues invoca, de uma forma inaceitável e enviesada, Jesus Cristo que nos disse:
“Mas, desde o princípio da criação, Deus fê-los homem e mulher. Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe para se unir à mulher, e serão os dois um só. Portanto, já não são dois, mas um só. Pois bem, o que Deus uniu não o separe o homem.” (S. Marcos, 10, 6 -9).
Jesus Cristo defende aqui a concepção actual e moderna de família nuclear, que é basicamente composta pela mulher como núcleo central, e depois por três seres humanos do sexo masculino: o filho da mulher, o marido da mulher, e o irmão da mulher. Mas Jesus Cristo adiciona um conceito crucial: o de que “o que Deus uniu não o separe o homem”. O seja, segundo Jesus Cristo, o casamento cristão é indissolúvel.
“Contra a Igreja triunfante e a Igreja militante, o novo clero incorpora-se na Igreja claudicante” — Nicolás Gómez Dávila
Mas para Frei Bento Domingues, esta opinião de Jesus Cristo acerca do casamento é “coisa do passado”. Diz ele que “o Cristianismo não é nostalgia de um paraíso perdido, mas a saudade de um futuro de transfiguração”. A influência da Nova Teologia, por um lado, e os elementos gnósticos de uma fé metastática estão bem presentes no pensamento de Frei Bento Domingues. A verdade, porém, e ao contrário do que defende o frade, é que o “futuro de transfiguração”, segundo a doutrina cristã genuína, não é imanente mas antes é transcendência, por um lado; e, por outro lado, esse “futuro de transfiguração” não pode ser concebido sem o conceito de “paraíso perdido” e de “queda”. O que Frei Bento Domingues defende não é o Cristianismo: é outra coisa, que ele não se atreve a dizer o que é.
“Nos tempos aristocráticos, o que tem valor não tem preço; em tempos democráticos, o que não tem preço não tem valor” — Nicolás Gómez Dávila
Mas o mais grave, nas ideias do Frei Bento Domingues, é a submissão da doutrina da Igreja Católica às leis do mercado das ideias e dos valores; é, neste caso concreto, a submissão da ética cristã ao Modelo Discursivo do marxismo cultural de Habermas. Mas se o mercado das ideias e dos valores mudar, o Frei Bento Domingues também muda de ideias e de valores, como uma espécie de cata-vento na torre de uma igreja:
“Sobre o campanário da igreja moderna, o clero progressista, em vez de uma cruz, coloca um cata-vento” — Nicolás Gómez Dávila.
Texto do frade em PDF
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