Eu pensava que a revisão da Constituição, proposta por Passos Coelho, era irrelevante; ou melhor: não era coisa urgente. Perante isto, mudei de ideias.
Eu pensava que a revisão da Constituição, proposta por Passos Coelho, era irrelevante; ou melhor: não era coisa urgente. Perante isto, mudei de ideias.
Eu estou a escrever estas linhas porque “sigo” o blogue que escreveu isto.
A maioria dos países do hemisfério norte têm uma qualquer espécie de Tribunal Constitucional — por exemplo, nos Estados Unidos, a função de fiscalização do cumprimento da Constituição compete ao Supremo Tribunal de Justiça. Até na Rússia de Putin existe um Tribunal Constitucional, para não falar na Alemanha ou na Irlanda, ou da França.
Defender a ideia segundo a qual o Tribunal Constitucional não serve para nada, é dizer que a esmagadora maioria dos sistemas políticos do mundo são produto de lunáticos. Só não existe Tribunal Constitucional em um país que não tenha um Estado de Direito.
Quando nós nos referimos a uma Constituição, podemos fazê-lo de duas maneiras: por intermédio de uma análise ideológica, ou através de uma abordagem jurídica. Na abordagem jurídica, é o formal (a forma do Direito Positivo) que impera, e não as considerações ideológicas. E se fizermos uma análise ideológica de uma Constituição, normalmente desqualifica-se, mais ou menos, a formalidade do Direito Positivo — que é o que o Passos Coelho e Paulo Portas estão a fazer.
Um Tribunal Constitucional tem que se ater, formalmente, ao que está escrito na Constituição. De outra forma seria um órgão político propriamente dito — que não é, até porque o Tribunal Constitucional só se pronuncia a pedido de alguém.
Esta Constituição está em vigor porque, mal ou bem, a maioria dos portugueses votaram em partidos políticos que a elaboraram, apesar das sucessivas revisões da Constituição ao longo do tempo. Não é legítimo que alguém venha dizer que, “porque os portugueses são burros e eu sou mais inteligente, defendo que o Tribunal Constitucional deveria desaparecer e deveria ser imposta a minha vontade porque eu sou um iluminado!”
O problema não é o de se concordar, ou não, ideologicamente, com a Constituição. O problema é o da assunção de um princípio: quem não tem princípios é um selvagem. Se existe uma Constituição, boa ou má, é para ser respeitada; e se não concordamos ideologicamente com ela, o que temos que fazer é mudá-la — mas nunca colocar em causa o princípio do valor da Constituição.
(Referendo)
Os cidadãos eleitores recenseados no território nacional podem ser chamados a pronunciar-se directamente, a título vinculativo, através de referendo, por decisão do Presidente da República, mediante proposta da Assembleia da República ou do Governo, em matérias das respectivas competências, nos casos e nos termos previstos na Constituição e na lei.
O referendo pode ainda resultar da iniciativa de cidadãos dirigida à Assembleia da República, que será apresentada e apreciada nos termos e nos prazos fixados por lei.
No Direito Positivo, a legitimidade dos tribunais escora-se em uma Constituição (Kelsen): é a Constituição que impede uma regressão infinita dessa mesma legitimidade. E qual é a Constituição que torna legítimas as decisões do Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos”? Essa Constituição simplesmente não existe. Uma Constituição não é uma espécie de Tratado de Lisboa.
Portanto, a questão da adopção de crianças por pares de invertidos (ou co-adopção, que é a mesma coisa) não pode ser imposta em Portugal a partir de uma decisão do Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos”, porque este não tem legitimidade constitucional para o fazer. O máximo que o Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” pode fazer é recomendar “isto ou aquilo”, e não impôr seja o que for a um Estado nacional.
E o problema da adopção de crianças por pares de invertidos começou por aqui: por um sofisma e por uma construção ideológica irracional que atribui ao Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” poderes que este órgão não tem de facto.
O Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” é baseado na Convenção Europeia dos Direitos Humanos; mas esta Convenção não é uma Constituição: à luz do Direito Positivo, o Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” não tem legitimidade para ser o fundamento da “legalização da dominação” (Max Weber) nos estados nacionais da Europa.
Por outro lado, o Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” não pode extrapolar as normas da Convenção Europeia dos Direitos Humanos e inventar novas normas a partir das cláusulas da dita Convenção: o Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” não foi criado para criar Direito, mas apenas para supervisionar as normas estipuladas pela Convenção.
O principal argumento de Isabel Moreira (e da Esquerda) para justificar a adopção de crianças por pares de invertidos (e a co-adopção, que vai dar no mesmo) foi o de um acórdão do Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos”, considerado (ilegitimamente) legítimo. Ou seja, a Esquerda e os homófilos partiram de sofisma jurídico que não tem nenhuma legitimidade constitucional.
A autoridade política depende, ou do consentimento do povo (que se traduz nas normas da nossa Constituição e por via das eleições), ou afirma-se por via do senso-comum em que uma determinada prática é aceite em função dos costumes.
O Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” nunca recebeu qualquer mandato do povo português para impôr a sua “legalização da dominação”. Não tem legitimidade democrática: o povo português nunca votou para lhe dar o Poder de impôr quaisquer normas no nosso ordenamento jurídico. Nenhum governo português alguma vez assinou um Tratado reconhecendo que o Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” tem a autoridade de regulamentar e unificar os “direitos humanos” na Europa, ou que o Tribunal Europeu dos “Direitos Humanos” esteja para os estados nacionais da Europa na mesma posição que o Supremo Tribunal de Justiça dos Estados Unidos está para este país.
Portanto, se o Tribunal Constitucional (português) não aprovar este referendo, ou se o presidente da república o vetar, estamos em presença de traição à pátria e da revogação da nossa Constituição em nome de uma Constituição supranacional que não existe.
Normalmente, só nos lembramos de Santa Bárbara quando troveja; só quando o céu nos cai em cima é que nos lembramos das estrelas.
O ideário de Passos Coelho passa pela seguinte premissa de acção: “Se confrontarmos directamente a Esquerda, mudando a Constituição sem o consenso parlamentar que ela própria instituiu, Portugal seguirá na senda do progresso”.
Esta atitude de Passos Coelho — que vem de longe, ainda antes de ele ser primeiro-ministro — tem uma base ideológica e não propriamente pragmática. Eu não sei se ele tem ou não razão, porque não sou bruxo e não posso adivinhar o futuro (como ele parece adivinhar); não sei se vai haver progresso, ou não. Eu apenas vejo tendências do futuro que se circunscrevem ao curto/médio prazo e que dependem de variáveis políticas e culturais evidentes (toda a gente as pode ver). É neste sentido que se pode dizer que Passos Coelho é temerário e, por isso, não é prudente.
Passos Coelho parte do princípio de que o eleitorado estará sempre de acordo com a sua (dele) ideologia, e que “o tempo da influência Esquerda já era”; e por isso — pensa ele — nem é preciso acordo parlamentar para mudar a Constituição: obriga-se o Tribunal Constitucional a mudar a Constituição, e de facto. Passos Coelho protagoniza um golpe-de-estado em Portugal com o apoio dos “mercados”.
A Constituição precisa de ser mudada? Em algumas coisas, sim! É legítimo um golpe-de-estado jurídico, imposto pela plutocracia internacional, para mudar a Constituição? Nunca! A partir do momento em que Passos Coelho tiver sucesso nesse seu golpe-de-estado jurídico contra a Constituição que temos (má ou boa), qualquer força política ou militar estará legitimada para acabar com a democracia representativa em Portugal.
Em postal pretende comentar estoutro.
A previsão dos movimentos do inimigo tem a virtude de impedir os ataques surpresa. Exactamente por isso tenho escrito sobre a agenda política gayzista desde 2003, e de certo modo fui contribuindo, dentro do pequeno horizonte da blogosfera, para que os ataques culturais gayzistas no nosso país não fossem imprevisíveis.
O gayzismo tem vários níveis de aprovação:
Cavaco Silva mandou a Constituição Portuguesa às malvas, quando ratificou o Tratado de Lisboa; agora está preocupado com as pressões políticas sobre os poderes constitucionais distribuídos. Não lhe ocorrerá que uma coisa está ligada à outra?