perspectivas

Domingo, 1 Maio 2016

A inveja é o combustível da Esquerda

Filed under: A vida custa — O. Braga @ 11:03 am
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Normalmente confunde-se ambição, por um lado, e inveja, por outro lado. Um indivíduo ambicioso pode não ser invejoso; e a inveja é o maior defeito que pode existir. Diz o povo que “nem o invejoso medrou, nem quem à beira dele morou”. Quando nos deparamos com um invejoso, é imperioso que fujamos dele a sete pés.

O ambicioso é aquele que quer ter o que os outros têm; o invejoso é aquele que não quer que os outros tenham. O ambicioso constrói; o invejoso destrói.

Eu não tenho inveja dos ricos; até gosto que eles existam: é bom sinal para a sociedade. Adoro ver Ferraris na rua, mesmo sabendo que não tenho dinheiro para comprar um. Quantos mais Ferraris em circulação, mais eu me sinto confortado, porque revelam que existe dinheiro disponível na sociedade. E quando existe dinheiro na sociedade, toda a gente (uns mais, outros menos) acaba por beneficiar.

Nas décadas de 1970 e 1980, a cidade do Porto era conhecida como a “cidade dos Lamborghini”: havia mais Lamborghini por metro quadrado na cidade do Porto do que em qualquer outra parte do mundo. A Esquerda via esse facto como uma mal, mas eu sempre achei que fosse um bem.

A inveja corrói a mentalidade portuguesa. E essa inveja é a maior arma da Esquerda.

Eu não tenho qualquer objecção em relação ao facto de alguém ganhar 100 vezes mais do que eu — porque não sinto inveja. A minha objecção, em relação ao patronato português, pode ser traduzida por G. K. Chesterton:

«Um homem honesto apaixona-se por uma mulher honesta; ele quer, por isso, casar-se com ela, ser o pai dos seus filhos, e ser a segurança da família.

Todos os sistemas de governo devem ser testados no sentido de se saber se ele pode conseguir este objectivo. Se um determinado sistema — seja feudal, servil, ou bárbaro — lhe dá, de facto, a possibilidade da sua porção de terra para que ele a possa trabalhar, então esse sistema transporta em si próprio a essência da liberdade e da justiça.

Se qualquer sistema — republicano, mercantil, ou eugenista — lhe dá um salário tão pequeno que ele não consiga o seu objectivo, então transporta consigo a essência de uma tirania eterna e vergonha».

— G. K. Chesterton, “Illustrated London News”, Março de 1911.

Não é importante que o patrão ganhe 100 vezes mais do que o operário; o que é importante é que um operário se apaixone por uma mulher honesta, se case com ela, seja pai dos filhos dela, e que seja a segurança da família.

Terça-feira, 5 Abril 2016

O Maltez e o capital

Filed under: A vida custa — O. Braga @ 1:06 pm
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Ora vamos tentar analisar este “poste” do Maltez:

jm-capital

Antes de mais temos que saber o que é o “capitalismo” — porque já sabemos o que é o “capital”: é o “vil metal”.

O capitalismo é um sistema económico que se baseia na propriedade dos meios de produção, e que pressupõe uma tendência para a concentração de capitais.

Segundo esta definição, podemos falar em capitalismo ateniense (da Atenas da Grécia antiga), de capitalismo romano do fim do império romano, de um capitalismo bancário na Idade Média (por exemplo, com os templários), de um capitalismo do Renascimento (Florença, Nuremberga), e, finalmente, também podemos falar de um capitalismo de Estado (URSS, Cuba, etc.). Porém, quando até há pouco tempo se falava em “capitalismo”, referia-se normalmente ao liberalismo económico da escola escocesa de economia que teve o seu principal intérprete em Adam Smith.

Portanto, se o capital é um roubo, temos que voltar à Idade da Pedra, ou ao tempo em que os animais falavam.

Sábado, 12 Março 2016

A plutofobia e a Teoria Crítica do Anselmo Borges

 

1/ Imaginemos um mundo onde ninguém morria de fome e em que as doenças comuns eram tratadas com um mínimo de dignidade. Neste cenário, o Anselmo Borges viria criticar esse mundo injusto, afirmando, por exemplo, que uma minoria da população do mundo tem aparelhos de televisão de plasma e Mercedes-Benz, e que a esmagadora maioria dos pobres vê as telenovelas em aparelhos de televisão anacrónicos e conduz um Smart.

Que mundo injusto!, seria esse!, Anselmo Borges!

O ideário revolucionário, que o Anselmo Borges defende, é responsável pelo maior morticínio de que reza a História — desde o nazismo aos Gulag, passando por Mao Tsé Tung e Pol-pot. Mas enquanto houver uma só pessoa que morre de fome no mundo, o Anselmo Borges não calará a sua voz contra os ricos. A estratégia ideológica do Anselmo Borges baseia-se na Teoria Crítica do marxismo cultural da Escola de Frankfurt: criticar, criticar, criticar!; ¿e soluções praticamente viáveis? nenhumas.

Imaginemos que, há vinte anos, um pobre ganhava em Portugal 200 Euros em média, e um rico ganhava 100.000 Euros. E suponhamos que hoje um pobre ganha 600 Euros, e um rico 200.000 Euros. Ou seja, ambos aumentaram os seus rendimentos; mas o Anselmo Borges viria dizer que o pobre saiu prejudicado do negócio e que o país está pior.

Morria muito mais gente de fome, no mundo, há trinta anos do que hoje. Mas o Anselmo Borges só se foca nos ricos. Não lhe interessa saber se a fome diminuiu no mundo: basta que haja um só pobre que morra de fome no mundo para que ele sinta que tem legitimidade para atacar os ricos. Ora vejam o que o Anselmo Borges escreve:

“Os pobres, apesar de, em geral, estarem menos mal, são cada vez mais pobres”.

procrustes07Ou seja, segundo o Anselmo Borges, os pobres estão menos mal do que no passado, mas estão cada vez mais pobres. Estão menos mal, mas mais pobres; estão menos pobres, não obstante estejam mais pobres. São uma coisa e o seu contrário. O que interessa é atacar os ricos.

Se um dia um pobre andar de Mercedes-Benz, e um rico de disco voador, o Anselmo Borges virá dizer: “Os pobres, apesar de, em geral, estarem menos mal, são cada vez mais pobres”. O que é intolerável é que o rico ande de disco voador; o direito do pobre ao Mercedes-Benz é inviolável e tem direito também ao disco voador. E se todos não têm um disco voador, então segue-se que ninguém tem direito a disco voador. O Anselmo Borges faz lembrar a estória de Procrustes.

Se um dia, por hipótese, o capitalismo acabar com a fome no mundo, a ausência da fome no mundo irá ser invocada pelo Anselmo Borges para acabar com o capitalismo — porque o Anselmo Borges raciocina em Circulus In Demonstrando: o "telos" do Anselmo Borges é acabar com o capitalismo, e a “fome no mundo” é apenas um instrumento circunstancial da doutrina.

2/ o Anselmo Borges critica o globalismo capitalista, mas simultaneamente defende um governo mundial. Ou seja, estamos em presença de dois tipos de globalismo: e o Anselmo Borges pensa que o dele é melhor do que o outro. Não é o globalismo em si mesmo, e o desprezo pelas nações, que o Anselmo Borges critica; para ele, as nações devem ser sacrificadas em função de um governo mundial em que os relapsos encontrarão refúgio político em Marte. O pensamento do Anselmo Borges é totalitário.

Ou seja, o Anselmo Borges faz (orgulhosamente) parte do problema do globalismo.

3/ o mais desprezível, em Anselmo Borges, é a instrumentalização ideológica do Cristianismo.

A parábola dos talentos, de Jesus Cristo, por exemplo, é um apelo à meritocracia e ao esforço pessoal. Jesus Cristo não criticou o rico enquanto tal: criticou a avareza. E um homem avaro pode não ser rico. Aliás, uma característica dos anti-capitalistas é o amor inusitado pelo dinheiro — o que justifica a obsessão do Anselmo Borges em relação aos ricos.

4/ não se presuma, deste meu texto, que o mundo está em ordem e que não necessita de alterações.

O que nós não devemos fazer é partir dos mesmos pressupostos do capitalismo para o atacar, por um lado, e por outro lado, não devemos atacar o capitalismo quando a História já nos demonstrou que a alternativa a ele é a utopia sanguinária.

No utopista Anselmo Borges dorme um sargento da polícia.

Terça-feira, 2 Fevereiro 2016

Como surgiu o capitalismo

Filed under: filosofia — O. Braga @ 4:30 pm
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Eu acredito na tese de Max Weber — “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, 1905 — segundo a qual foi o ascetismo intra-mundano dos empresários calvinistas (cristãos) que (também) está na origem do capitalismo.

“¿Por que é que os interesses capitalistas na China ou na Índia não conduziram ao desenvolvimento científico, artístico, político, económico para via de racionalização que é característica do Ocidente?” → Max Weber

Há quem diga que “os calvinistas não eram católicos” e que “o catolicismo proibia a taxa de juro”. É falso!

Por exemplo, o prémio de seguro de risco foi “inventado” pelos frades menores franciscanos no século XIII (os “Fratelli”), e os templários utilizavam taxas de juro na suas transacções financeiras na Europa do mesmo século. A proibição da taxa de juro era apenas uma corrente ideológica da Igreja Católica, que não era unânime.

Os primeiros empresários capitalistas — segundo Max Weber — não procuravam o lucro desenfreado e cego por especuladores e aventureiros, mas antes procuravam o exercício honesto e constante de uma profissão: tratava-se de uma acumulação de riqueza destituída de qualquer interesse pelos prazeres que poderia proporcionar.

Por outro lado, segundo o Calvinismo, Deus decidiu, em virtude de decretos insondáveis e irrevogáveis, que “certos homens estão predestinados à vida eterna e outros destinados à morte eterna” (Confissão de Westminster, de 1647), o que causava uma angústia entre os calvinistas: “¿Será que eu serei eleito para a vida eterna?”

Nunca certo da sua eleição, o calvinista buscava os sinais dela aqui no mundo, nos frutos do trabalho, sem descanso nem alegria, trabalhava para a glória de Deus e, sobretudo, para mitigar a sua angústia. Os primeiros capitalistas eram frugais e quase ascetas, sem qualquer propensão para o luxo que a riqueza proporciona; a riqueza acumulada era apenas um sinal de bênção divina.

Foi assim que o capitalismo nasceu — segundo Max Weber — porque “se um tal travão ao consumo se alia à procura desenfreada do ganho, o resultado prático é evidente: o capital forma-se pela poupança forçada e ascética”.

A partir do momento da sua instituição, o sistema capitalista passou a obedecer às suas próprias leis — a partir do século XIX deixou de necessitar da religião que o fundou: dilui-se gradualmente no utilitarismo profano, e o fervor do capitalista religioso originário cede lugar ao homem absorvido pelo trabalho, esse calculador isolado que não conhece nem reconhece outra religião senão a do dinheiro.

O que, de início, era uma escolha — os actos de trabalhar e calcular — transformou-se em um destino: a perda da liberdade. “O puritano (calvinista) queria ser um homem trabalhador, e nós somos forçados a sê-lo”.

Não podemos separar a origem do capitalismo, por um lado, do Cristianismo, por outro lado. E quando separamos, não temos capitalismo propriamente dito, mas antes temos o neoliberalismo que se iniciou com a preponderância ideológica do Marginalismo de finais do século XIX.

Domingo, 31 Maio 2015

O neoliberalismo apoia a agenda política cultural radical de Esquerda

 

A revista britânica The Spectator  publica um artigo que tenta explicar por que razão os mais ricos do mundo — a plutocracia a que chamamos de “neoliberalismo” — apoia as políticas culturais da Esquerda, e muitas vezes da Esquerda mais radical. Vou tentar fazer aqui um resumo do artigo.

¿Por que razão a maioria das empresas multinacionais, por exemplo, a Google, apoiou o SIM no recente referendo acerca do “casamento” gay na Irlanda? E ¿por que razão os plutocratas, em geral, apoiam as lutas de Esquerda naquilo a se convencionou chamar de “justiça social”?

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Domingo, 5 Abril 2015

Existe uma diferença fundamental

Filed under: cultura — O. Braga @ 6:13 pm
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“A assistência a um debate sobre o Alqueva organizado pela Caritas de Beja ficou perplexa por ouvir o bispo da Diocese, D. Vitalino Dantas (originário do Minho), defender políticas sociais semelhantes às do PCP – segundo li no Público.”

Bispo de Beja com políticas sociais do PCP

O cristão diz: “O que é meu, é teu.” O comunista diz: “O que é teu, é meu.”

É esta a real diferença.

O cristão dá porque quer dar; o comunista tira porque quer tirar. Uma coisa é dar, e outra coisa é tirar. Não podemos confundir os dois verbos.


Mas consigo concordar com um facto: o capitalismo perdeu as suas raízes na cultura antropológica.

Dou um exemplo do jornal Púbico: o capitalista Belmiro de Azevedo, em vez de sustentar um pasquim infestado de esquerdistas e com prejuízo financeiro, poderia utilizar esse dinheiro para obras de caridade. Teria prejuízo de qualquer maneira, mas ao menos seria útil à sociedade.

Não é demais recordar que o capitalismo teve a sua origem no Cristianismo calvinista. Foi essa cultura que se perdeu. Com o Calvinismo, “o trabalho tornou-se em um dever sagrado, e o êxito nos negócios uma prova evidente do favor de Deus e, segundo os conceitos do Antigo Testamento, um sinal da Sua predilecção. Pela ética calvinista se modelou o espírito da nascente burguesia capitalista: o espírito activo, continuamente dirigido para o êxito.” 1

O capitalismo primordial calvinista não fazia do dinheiro um fim em si mesmo: o dinheiro era apenas um meio para se atingir um fim último: merecer a escolha de Deus através do trabalho árduo. O neoliberalismo, pelo contrário, transformou o dinheiro em um fim em si mesmo, e entregou Deus nas mãos do clero esquerdista actual.

Nota
1. “História da Filosofia” de Nicola Abbagnano, volume V, § 370

Terça-feira, 26 Agosto 2014

O problema de fundo do actual capitalismo

 

Leio este artigo no blogue Blasfémias:

“Com este governo, esta maioria e, sobretudo, estas pessoas, não vamos lá: o défice voltou a entrar em descontrolo e adivinha-se novo aumento de impostos.

Por razões próprias e alheias, este governo não fez as reformas que tinha que fazer para domar a despesa pública, isto é, para atacar as causas profundas do défice. Pelo contrário, convenceu-se o governo de que o nível da despesa pública até poderia ser mantido ou baixar pouco («vamos manter o estado social», não cansaram de proclamar os seus dirigentes), caso os impostos aumentassem e as exportações também, fórmula mágica que dificilmente se consegue manter por muito tempo, porque explica o bom senso que nenhuma economia se desenvolve se não conseguir aforrar e investir. Um erro de amadores, portanto.”

E leio estoutro:

“As a result of Obamacare Medicaid expansion coupled with means-tested Obamacare assistance, I estimate welfare rolls expanded from 35.4% of the population in 2012 to about 40% in 2014.”

Almost Half of America on Welfare

Cerca de metade da população americana já vive do Estado Social. Portanto, o problema não existe só em Portugal. E isto leva-me a um texto de Kant, escrito poucos anos antes de ele morrer [“Teoria e Prática”, 1793]:

“Um governo que fosse fundado sobre o princípio da benevolência para com o povo — tal o do pai para com os seus filhos, quer dizer, um governo paternal —, onde, por consequência, os sujeitos, tais filhos menores, incapazes de decidir acerca do que lhes é verdadeiramente útil ou nocivo, são obrigados a comportar-se de um modo unicamente passivo, a fim de esperar, apenas do juízo do chefe do Estado, a maneira como devem ser felizes, e unicamente da sua bondade que ele o queira igualmente — um tal governo, digo, é o maior despotismo que se pode conceber.”

Aquilo que o blogue Blasfémias talvez não tenha compreendido é o facto de ser a própria plutocracia — ou seja, o capitalismo actual — que apoia e incentiva o Estado Social: basta verificarmos as posições políticas da maioria dos 50 mais ricos do mundo, incluindo Bill Gates, Rockefeller ou Rothschild. A ideia da actual plutocracia é a criação do “maior despotismo que se pode conceber”. É a isto que Adriano Moreira chama de “neoliberalismo repressivo”, em que a solidariedade cristã do capitalismo primordial é substituída por um capitalismo instrumental e utilitarista que, em troca do Estado Social, restringe a liberdade da pessoa.

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Sexta-feira, 1 Agosto 2014

Depois de Boisguilbert e Adam Smith, só nos resta hoje a entropia do capitalismo (por culpa própria)

 

Eu escrevi um verbete com o título “A expansão da “ideologia de mercado” tem que ser travada”; mas isso não significa que eu seja contra o capitalismo e/ou contra o mercado. Pelo contrário, sou a favor do verdadeiro capitalismo, que não é o actual.

Olhemos para o exemplo da Hungria, que é um país capitalista que tem um imposto único e universal (IRS) de 16%, e tem a palavra “Deus” inscrita na sua Constituição.

O leitor Horta Nobre deixou o seguinte comentário no referido verbete: “Talvez os fisiocratas nos possam dar uma ajudinha”.

Vamos ver (como diz o cego): aquilo que se convencionou chamar hoje de “neoliberalismo” já não é o liberalismo de Boisguilbert, dos fisiocratas (por exemplo, Quesnay) e de Adam Smith (por ordem cronológica de evolução ideológica). Vou transcrever a tradução de um trecho de Boisguilbert (“Dissertation de la nature des richesses de l’argent et des tributs” – 1707, pág. 986):

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Quinta-feira, 13 Março 2014

O tradicionalismo e o capitalismo

Filed under: Tirem-me deste filme — O. Braga @ 1:15 pm
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Alguém sabe quem inventou, na Europa, os prémios de seguro de risco e a taxa de juro de empréstimos financeiros?

O prémio de seguro de risco foi “inventado” (no sentido de ser concebido pela primeira vez na Idade Média) pelos Fraticelli católicos!, de finais do século XII (frades menores franciscanos, devotos da pobreza), e a taxa de juro foi “inventada” pela ordem católica dos Templários!, no século XIII.

Ou seja, a base do capitalismo foi concebida nos séculos XII e XIII!, em plena Idade Média católica! A prosperidade das cidades-estado italianas, durante o Renascimento, foi fundada em um capitalismo incipiente e elitista, nas taxas de juros e nos prémios de seguros de risco!

A novidade do Calvinismo — em relação ao capitalismo incipiente que existia já na Europa antes da Contra-reforma do Concílio de Trento — foi que o capitalismo se tornou popular (ler “A Ética Protestante”, de Max Weber), e não já uma prerrogativa de uma certa elite. ¿E por que razão o capitalismo se tornou popular?

O capitalismo popular, introduzido à sombra do Calvinismo, e segundo Max Weber, não se revela na procura desenfreada e cega do lucro por especuladores e aventureiros: pelo contrário, o capitalismo popular surge com a procura racional e sistemática, metódica e controlada, do lucro — mas no exercício honesto e constante de uma profissão.

A outra razão por que o capitalismo se tornou popular — em oposição ao capitalismo elitista que já existia, de certa forma, antes da Reforma — foi a doutrina determinista calvinista, segundo a qual Deus decidiu, em virtude de decretos insondáveis e irrevogáveis — portanto, para todo o sempre — que “certos homens estão destinados à vida eterna e outros votados à morte eterna” (Confissão de Westminster, de 1647).

E, como perder a Graça de Deus é tão impossível àqueles a quem foi (a priori) concebida, como também é impossível obtê-la por aqueles a quem foi (a priori) recusada, instalou-se uma angústia profunda no calvinista que se interroga: “¿Serei eu o eleito?”.

Nunca certo da sua eleição, o calvinista buscava os sinais da sua salvação aqui na Terra, nos frutos do seu trabalho sem descanso e sem alegria, trabalhava para a glória de Deus e para apaziguar a sua angústia. Tendo o trabalho por vocação e a riqueza por sinal da bênção divina, o calvinista acumulava necessariamente capital que não gastava. Foi assim que o capitalismo popular nasceu.

Hoje, em muitos países da Europa, esse capitalismo popular está moribundo e surgiu de novo (embora por outras razões) uma espécie de capitalismo de elites. A concentração de capital destruiu o capitalismo popular.

Portanto, ao contrário do que escreve o Guilherme Koehler, não é verdade que “antes da Reforma não existia capitalismo”. O que não existia era uma cultura utilitarista (utilitarismo), que também não existiu com a Reforma protestante. Mais tarde, já no século XVIII, e uma vez instituído, o sistema capitalista passou a obedecer às suas próprias leis, já não tendo necessidade da religião para nada; e surgiu, então, o império da ética utilitarista profana (com Bentham) que passou a assombrar a modernidade.

Enfim: os tradicionalistas deveriam ter mais respeito pela História para que possam ser mais credíveis.

Sábado, 15 Fevereiro 2014

A nova “democracia” sugerida pela Nova América

 

“Tom Perkins, the Silicon Valley billionaire, has risked further controversy by saying the rich should be given more votes than the less well off.

An unrepentant Mr Perkins also said those who paid no taxes whatsoever should be disfranchised.”

Rich should get more votes, says billionaire Tom Perkins

Eis o passo seguinte do neoliberalismo: “os mais ricos devem ter mais votos, e os pobres que não paguem impostos devem ser marginalizados da política”.

plutocrata webAs ideias têm causas e consequências. Que ninguém pense que estas ideias surgem por acaso, ou que não têm importância. Pelo contrário, são ideias bem maturadas e que pretendem afirmar-se em uma sociedade caracterizada pela maximização de uma ética utilitarista entendida no seu pior sentido.

O lógica do libertarismo de direita — económico e financeiro — conduz a uma distorção da democracia e mesmo a uma forma mitigada de totalitarismo. Os libertários de direita não se dão conta de que sem a democracia correm o sério risco de sofrerem represálias e revezes históricos.

Os princípios liberais clássicos, por exemplo o da igualdade fundamental do cidadão perante a lei, começam agora a ser colocados em causa pelo capitalismo egocêntrico que defende a ideia revolucionária segundo a qual “a humanidade encontra-se perante o Fim da História”.

Sábado, 28 Julho 2012

O cientismo é de esquerda

Teresa Forcades nasceu em 1966, é médica, teóloga e monja. E é uma mulher extraordinária. Muito corajosa, fala claro e sem complexos.

Numa entrevista a um canal catalão defende que o capitalismo não é ético e faz a sua denúncia de uma forma desassombrada.

via De Rerum Natura: O capitalismo não é ético.

O Rerum Natura é um blogue com duas características essenciais: é cientificista e de esquerda.

O seu cientismo já eu tenho aqui denunciado bastas vezes. E quando o Rerum Natura mistura o cientismo com o socialismo, damos razão a G. K. Chesterton — que, neste caso em concreto, refere-se a “cientismo” quando fala em “ciência” :

“A coisa que realmente tenta tiranizar por intermédio do governo, é a ciência. A coisa que realmente utiliza o braço secular é a ciência.

O credo que realmente cobra o dízimo e cativa as escolas, o credo que realmente se apoia no castigo e no aprisionamento, o credo que realmente é proclamado não em sermões mas em estatutos, e que é propagandeado não por peregrinos mas pela polícia — esse credo é o grande mas controverso sistema de pensamento que se iniciou com o evolucionismo e acabou no eugenismo.

O materialismo é realmente a nossa igreja estabelecida; pelo que o governo lhe dará realmente o apoio na perseguição aos seus hereges.” — G. K. Chesterton, “Eugenics & Other Evils” (1927).

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Segunda-feira, 6 Fevereiro 2012

A imediatização do lucro e a decadência do Neoliberalismo: um problema ético

Filed under: cultura — O. Braga @ 1:52 pm
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“É verdade que, como seria de esperar, países com maiores défices primários acabam por apresentar spreadsmais elevados nos seus CDS. Mas, por outro lado, parece haver uma influência reduzida nos CDS das expectativas para os défices públicos, a sustentabilidade da dívida e o crescimento económico no curto prazo, em contrapartida com um impacto muito significativo do crescimento económico registado no presente.

via Afinal é o crescimento no curto prazo o que preocupa os mercados – Economia – PUBLICO.PT.

A preocupação excessiva dos mercados com a forma como as economias reagem no curto prazo é uma das características do capitalismo neoliberal — porque o capitalismo nem sempre foi predominantemente neoliberal. Por mais estranho que possa parecer, este fenómeno das expectativas a curto prazo tem raízes culturais, e por isso, éticas. Muita gente não se dá conta de que o capitalismo se está a esboroar por culpa própria, porque se afastou da sua matriz cultural tradicional.

As pessoas habituaram-se aos proventos rápidos; querem as coisas aqui e agora. Há 40 anos, um bom investimento pagava-se a si próprio a fim de 5 anos; há 20 anos, um bom investimento pagava-se em 3 anos; e hoje, deve pagar-se em menos de 1 ano, para depois começar a ser rendimento puro, sem a despesa de investimento. E os governos de alguns países com o poder político, económico e financeiro centralizados e controlados pelo Estado, como é o caso da China, compreenderam este fenómeno cultural (e ético) do Ocidente de imediatização do lucro que caracteriza a decadência do capitalismo neoliberal; e por isso, alimentam-no em proveito próprio.

Por outro lado, o Neoliberalismo está a acabar com os valores indispensáveis ao capitalismo tradicional: uma cultura cívica, a instituição do casamento natural, a honestidade no trabalho dedicado, e a religião. Todos estes valores que fundamentavam o capitalismo tradicional e o “American Way of Life” estão em decadência, graças ao capitalismo neoliberal do lucro “aqui e agora, já!”

Hoje, quem for a favor do capitalismo não pode ser neoliberal.

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