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Terça-feira, 8 Novembro 2016

O Cristiano Ronaldo, o Rolando Almeida, e Nozick

Filed under: A vida custa — O. Braga @ 12:20 pm
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O Rolando Almeida escreve aqui:

“Cristiano Ronaldo assinou novo contrato com o Real Madrid, o seu clube. Passa a ganhar cerca de 20 milhões de euros de salário por ano. Será moralmente justo? Deve o Estado intervir e cobrar mais impostos ao vencimento do Ronaldo para equilibrar a redistribuição da riqueza? Se o Ronaldo não é totalmente responsável pelo seu talento (pode ser hereditário) será justo ganhar mais que todos os outros que não podem competir pela lotaria da natureza em igualdade de circunstâncias? Vale a pena aproveitar a ocasião e perder 30 minutos a ver esta aula de Harvard com o professor e filósofo Michael Sandel”.

E depois segue o vídeo.


Ora bem. Michael Sandel é um comunitarista (não confundir com “comunista”), tal como, por exemplo, MacIntyre. Portanto, Sandel tem uma posição publicada contra Nozick e contra o libertarianismo. Mas, por outro lado, Sandel (como todos os comunitaristas, por exemplo, Alasdair MacIntyre, Charles Taylor, e até Michael Michael Walzer) também é crítico do utilitarismo nas suas diversas manifestações, incluindo John Rawls. O vídeo não apresenta a opinião de Sandel.

O libertarianismo parte do princípio do “I Own Myself” (“eu sou proprietário de mim próprio”); o princípio está errado, e por isso a teoria consequente está errada.

Eu só seria proprietário de mim próprio se eu fosse o criador (existencial) de mim mesmo; e mesmo que eu fosse o criador de mim próprio, a criação é limitação (o criador limita aquilo que é criado); porque a criação é transformar qualquer coisa em alguma coisa.

Mas o facto de eu não ser o proprietário de mim próprio não significa que eu seja propriedade de outro ser humano ou do Estado. Nem significa que o Estado possa alegar a “defesa da minha liberdade” tornando-me propriedade dele.

A única forma de ultrapassar este problema é pensar como Montesquieu: “Se Deus não existisse, teria que ser inventado” — porque a partir do momento em que Deus não exista, o Estado passa a ser o deus que é nosso proprietário (Rolando Almeida); ou então, na ausência de Deus, passamos conceber-nos a nós próprios como “proprietários de nós mesmos”, como pensam os libertários e Nozick.

A partir do momento em que o conceito de “propriedade” passa ter um cariz metafísico, torna-se mais fácil estabelecer o equilíbrio de interesses entre aquilo que é direito de propriedade do Cristiano Ronaldo, por um lado, e aquilo que é o direito de propriedade do Estado e da sociedade em geral, por outro lado.

2 comentários »

  1. Vou tentar ser o mais explicito possível,o senhor não concorda que o princípio de não-agressão é evidente,falando numa esfera terrestre cada cidadão não é dono de si mesmo?
    Analisando mais profundamente,como manter um estado que não pratica violações grosseiras ao se arvorar “dono”de quase todo o que é produzido.

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    Comentar por Tiago Silva — Quinta-feira, 24 Maio 2018 @ 7:41 am | Responder

    • 1/ não é possível (do ponto de vista da Física) separar o planeta Terra do resto do universo.

      2/ o ser humano é responsável pelo seu corpo e pela sua vida, mas não é proprietário do seu corpo e da sua vida.

      3/ a única forma de combater o Estado plenipotenciário é ter em boa conta os pontos 1. e 2. supracitados.

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      Comentar por O. Braga — Quinta-feira, 24 Maio 2018 @ 1:36 pm | Responder


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