“A Idade Moderna, com a sua crescente alienação do mundo, conduziu a uma situação em que o homem, onde quer que vá, apenas se encontra a si mesmo. Todos os processos da Terra e do Universo revelaram-se a si mesmos como feitos-pelo-homem ou como potencialmente feitos-pelo-homem.
Depois de terem devorado, por assim dizer, a sólida objectividade do dado, esses processos [científicos e históricos] acabaram por esvaziar de sentido o processo global único (que originalmente fôra concebido para conferir sentido ao particular), comportando-se, digamos, como um eterno espaço-tempo onde aqueles [os processos] podem evoluir sem conflitos nem tentativas de exclusão mútua. Foi isto o que aconteceu com o nosso conceito de História, tal como com o nosso conceito de Natureza.
Nesta situação de radical alienação do mundo, a Natureza e a História são de todo inconcebíveis. Esta dupla perda do mundo — a perda da Natureza e a perda do artifício humano no seu sentido mais lato, que inclui toda a História — deixou atrás de si uma sociedade de homens que, privados de um mundo comum que os relacionaria e separaria ao mesmo tempo, vivem ora num desesperado e solitário isolamento, ora comprimidos numa massa.
De facto, uma sociedade de massas não é mais do que o tipo de organização que se estabelece automaticamente entre os seres humanos quando estes ainda têm relações que os unem, mas perderam já o mundo que outrora era comum a todos eles”.
Hannah Arendt (“Entre o Passado e o Futuro”, página 103)
Roger Scruton é de opinião de que a herança cultural intelectual vai salvar o Ocidente da decadência, mesmo quando a religião cristã já não exista na cultura antropológica. É também contra este tipo de conservadores (como Roger Scruton) que se ergue a Direita Alternativa (AltRigt).
Num dos seus livros, Eric Voegelin dizia que Heródoto não compreendeu Homero; bastaram 300 anos para que Homero se tornasse incompreensível ao historiador grego; lá se foi a herança cultural pela pia abaixo.
No meu tempo de liceu, estudei “Os Lusíadas”, de Luiz de Camões, no 5º ano; hoje, “Os Lusíadas” foram eliminados do ensino secundário. E, com o novo Acordo Ortográfico, torna-se mais difícil aos alunos compreender Camões. Lá se foi a herança cultural pela pia abaixo.
A perda da religião cristã na cultura antropológica europeia levará a uma de duas hipóteses: ou à arbitrariedade do Poder político (laicismo radical e totalitário), ou ao Islão.
Essa sua previsão é tão real quanto a previsão do Roger Scruton; sabe qual é o maior equívoco dos cientistas do século 21? É a sua fé incontrolável pelas previsões: “Não vos inquieteis, pois, pelo dia de amanhã, porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.” Mateus 6:34
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Comentar por marco carvalho — Domingo, 11 Setembro 2016 @ 11:41 am |
A fé é confiança; mas confiança não é estupidez. Aquele que confia não é necessariamente estúpido.
Quando o vento sopra do norte, é um facto que sopra do norte e não do sul. Existem factos, e existem tendências, que são mais ou menos racionais.
Por exemplo: quem olha para o céu muito nublado, e verifica que existe uma forte tendência para chover, e mesmo assim não leva um guarda-chuva quando sai de casa, é um estúpido — por muita fé que tenha em S. Mateus.
“Tendência” não é a mesma coisa que “fé em previsão” ou “adivinhação”; a tendência é empiricamente evidente.
E quando você não consegue ver a diferença entre “tendência”, por um lado, e “fé em previsão”, por outro lado, você não pode compreender metade daquilo que o verbete pretende dizer.
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Comentar por O. Braga — Domingo, 11 Setembro 2016 @ 12:07 pm |