perspectivas

Sábado, 4 Julho 2015

Richard Dawkins dá razão ao Padre Gonçalo Portocarrero de Almada

 

O Ludwig Krippahl diz que não tem alma. Cada um pensa de si o que quiser. Convém contudo dizer que, segundo a ontologia aristotélica que influenciou o Cristianismo, os animais têm alma, embora não tenham espírito (autoconsciência). Mas não vale a pena explicar ao Ludwig Krippahl a diferença entre alma e espírito, porque teríamos que obrigá-lo a ler Platão e Aristóteles — o que é uma maçada, convenhamos! Escreve ele:

“O ADN dá-nos uma medida conveniente de distância evolutiva e, nessa, eu e o chimpanzé estamos equidistantes da aranha. Mas não é só o ADN que sugere que o chimpanzé e eu estamos mais próximos. A nossa anatomia é semelhante mas muito diferente da da aranha e partilhamos capacidades para resolver problemas, sentir afecto, aprender, comunicar e interagir em sociedade que nos afastam a ambos da aranha.”

dawkins-and-freud-webHá problemas que uma aranha resolve que não passam pela cabeça do macaco. Cada ser vivo (cada espécie) resolve os seus problemas. O que não devemos é confundir, por exemplo, o comportamento submisso de um cão, com “afecto” (como está hoje na moda); ou não devemos confundir “instinto” e “afecto” (por exemplo, o instinto maternal, que vemos nos leões ou nos símios, mas também no ser humano), nem devemos confundir “instinto” — que é próprio de todos os animais em geral— e “intuição” que é exclusivo do ser humano.

O Ludwig Krippahl concebe apenas a forma das coisas, e ignora ostensivamente o conteúdo delas.

Do ponto de vista do conteúdo do ser (e foi isto que o Padre Gonçalo  Portocarrero de Almada quis dizer), «a distância que vai do mais apto dos símios para o mais estúpido dos homens é infinitamente superior à que dista entre o mais evoluído dos primatas e o mais básico ser vivo» — exactamente porque a alma aristotélica, princípio de pensamento, privilégio e essência do Homem, dá acesso à liberdade e à moral.

O Ludwig Krippahl pensa que não: pensa ele que existe menos liberdade e menos moral numa aranha do que num símio. Para ele, um macaco tem mais liberdade e mais moral do que uma aranha. Ora, é aqui que eu divirjo dele e me aproximo do Padre Gonçalo  Portocarrero de Almada: nem a aranha nem o macaco têm liberdade e moral; e por isso é que estão ambos infinitamente distantes do ser humano.


Numa entrevista a uma revista1 , foi perguntado a Richard Dawkins o seguinte: “¿O senhor pensa que o ser humano poderia superar as leis da evolução?”. E Richard Dawkins respondeu assim:

“Sim, de uma maneira limitada; no entanto, importante para nós. Embora nós sejamos seres darwinianos, podemos olhar para o futuro. Podemos perguntar-nos em que sociedade desejamos viver. É uma sociedade na qual as regras são respeitadas, independentemente da forma que assumam num determinado país. Penso que isto é algo singular, algo anti-darwiniano, algo que nunca foi observado em nenhum outro ser vivo”.

Ou seja, Richard Dawkins constatou uma evidência: não é preciso qualquer demonstração através do ADN para chegar à conclusão a que ele chegou. Quando ele diz que há “algo (no ser humano) que nunca foi observado em nenhum ser vivo”, o que ele diz, de facto, é que «a distância que vai do mais apto dos símios para o mais estúpido dos homens é infinitamente superior à que dista entre o mais evoluído dos primatas e o mais básico ser vivo».

No entanto, o Ludwig Krippahl consegue ser radicalmente mais darwinista do que o Richard Dawkins — o que é obra! Isso não tem nada a ver com darwinismo: antes tem a ver com ideologia política que levou o Ludwig Krippahl a militante do partido “Livre”.

Com esta afirmação, foi o próprio Richard Dawkins quem revelou o ponto fraco da sua argumentação radical darwinista: ou somos escravizados pelos nossos genes e/ou pelo nosso ADN, ou então temos em relação a eles a liberdade de manifestar comportamentos que permitem a sobrevivência de toda a biosfera da Terra.

É precisamente porque o ser humano está infinitamente distante dos símios e das aranhas que tem a liberdade de proteger os símios e as aranhas.


Nota
1. revista alemã “Focus”, nº 39, 1996

9 comentários »

  1. […] Resposta a isto: Aqui.  […]

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    Pingback por Igualdade para todos, para que nós sejamos superiores | perspectivas — Sábado, 4 Julho 2015 @ 7:09 am | Responder

  2. Ou seja (extrapolando): mesmo que existisse um gene gay, isso não significaria que seus portadores inevitavelmente teriam de ser gays.

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    Comentar por Paulo De Tarso — Sábado, 4 Julho 2015 @ 1:53 pm | Responder

    • A ciência ainda não demonstrou que exista um “gene gay”; ou seja, não podemos afirmar que exista um gene gay. Convém notar que “um gene” não é a mesmo coisa que o ADN inteiro. É possível, no entanto, que a tendência homossexual seja transmissível para as gerações futuras através da epigenética — mas isto também não está demonstrado pela ciência: estamos no campo da especulação.

      Um só gene, na imensa cadeia do ADN, não pode determinar um comportamento do ser humano. O facto de existir uma tendência (seja genética, seja congénita, seja epigenética, seja biológica) para um determinado comportamento no ser humano, não significa que consideremos esse comportamento inevitável.

      Neste sentido, sim, podemos afirmar:

      “mesmo que existisse um gene gay, isso não significaria que seus portadores inevitavelmente teriam de ser gays”.

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      Comentar por O. Braga — Sábado, 4 Julho 2015 @ 2:23 pm | Responder

      • Perfeito. Daí também decorre que a discussão sobre ser a homossexualidade uma orientação (como quer a esquerda) ou uma opção mostra-se enganosa, ou superficial, ou, ao menos, ganha outra dimensão. Por exemplo, a defesa do “casamento” gay (com direito a “ter” filhos) por ser a homossexualidade uma orientação e não uma opção – pois quem se comporta sexualmente de forma infértil não pode fugir às conseqüências dessa opção.

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        Comentar por Paulo De Tarso — Sábado, 4 Julho 2015 @ 4:33 pm

      • O casamento é uma instituição que se caracteriza pela aliança entre a mulher e o homem — aliança entre os dois sexos — com a sucessão das gerações.

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        Comentar por O. Braga — Sábado, 4 Julho 2015 @ 4:51 pm

    • Nem vale a pena discutir isso. Quando lidamos com burros, é burrice dar-lhes atenção.

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      Comentar por O. Braga — Sábado, 4 Julho 2015 @ 4:53 pm | Responder

  3. Neil Degrasse Tyson é o cientista “pop star”, e se ele acredita realmente no que diz, realmente trata-se de um indivíduo muito inocente, digno de pena. A analogia da laranja é uma “pérola”(Pérola = Fala ou escrita que contém um erro crasso ou uma afirmação esdrúxula.).

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    Comentar por Marco Rezende — Sábado, 4 Julho 2015 @ 5:11 pm | Responder


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