Há aqui uma pequena confusão entre a “formatação”, no sentido de disciplina mental excessiva que coarcta a criatividade, por um lado, e por outro lado a “burocracia” – porque a burocracia pode ser altamente criativa!
“Das feições de alma que caracterizam o povo português, a mais irritante é, sem dúvida, o seu excesso de disciplina. Somos um povo disciplinado por excelência. Levamos a disciplina social àquele ponto de excesso em que coisa nenhuma, por boa que seja – e eu não creio que a disciplina seja boa -, por força que há-de ser prejudicial.
(…)
Parecemo-nos muito com os alemães. Como eles, agimos sempre em grupo, e cada um do grupo porque os outros agem.” – Fernando Pessoa, Ideias Políticas
Ora bem. Como se pode ver, a crítica à “formatação” não é novidade. O problema é que há aqui uma falta de graduação que conduz a extremos: por um lado, o “ódio” de Fernando Pessoa a qualquer tipo de disciplina – o que é mau: Fernando Pessoa não compreendeu, talvez, que nem toda a gente é génio; a genialidade que “odeia” a disciplina — mas que não prescinde da disciplina na sua formação! — é excepção.
Por outro lado, o excesso de disciplina conduz a uma espécie de “mentalidade alemã” que impera actualmente na nossa cultura política: se, como diz Fernando Pessoa e com alguma razão, “nos parecemos com os alemães”, a influência da cultura política alemã, que está na moda entre a nossa elite, conduz a um excesso de disciplina e de “formatação”. Passamos a ser “alemães ao quadrado”.
A formatação, em si mesma, não é má. O que é mau é o excesso de formatação. A criança deve aprender a raciocinar de forma lógica, mas sem que a lógica substitua o raciocínio.
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