Isto significa, segundo Calvino, que o intelectual deve ser crítico mesmo em relação à tendência política que perfilha ou com a qual simpatiza. E qualquer pessoa — e por maioria de razão, os intelectuais — amante da liberdade deve ser crítico em relação aos políticos que alegadamente defendem a liberdade. Desde logo, e ao participar nos eventos sentado nos ramos das árvores, o intelectual é apartidário não sendo apolítico. O intelectual que se senta no chão junto com os políticos é um “intelectual orgânico” — segundo Calvino e até Norberto Bobbio — e não um intelectual propriamente dito. O intelectual orgânico não consegue ter a visão panorâmica dos eventos que o pensador necessita.
Se eu gosto de liberdade? Gosto. Gosto de ter a liberdade, por exemplo, de escrever isto. Não podemos ser contra a liberdade e depois desfiarmos queixumes por não a termos. Não podemos ser contra a liberdade utilizando a liberdade para ser contra ela.
A liberdade está ligada à democracia? Depende. Depende das elites na democracia, como a existência da liberdade dependeu sempre das elites ao longo dos tempos. Passa-se algo similar com o estatuto da mulher: ao longo dos tempos e nas sociedades em que a mulher adquiriu um estatuto social mais complexo — por exemplo, em algumas sociedades da Idade Média —, a sociedade só ganhou com isso. E tanto o estatuto da mulher, como a liberdade existente dentro das corporações medievais, dependia das elites de cada momento histórico. A democracia actual não foge à regra.
Portanto, a ideia segundo a qual a democracia é necessariamente sinónimo de liberdade, é errónea. A ideia segundo a qual o processo de legislação e promulgação segundo o formalismo do Direito Positivo, aplicado à democracia representativa, é sinónimo de liberdade, é errónea. Depende das elites, agora como sempre. E se temos hoje uma elite corrupta e/ou amoral que confunde propositadamente liberdade com libertinismo, de nada nos serve a democracia: a liberdade acabará sempre, com o decorrer do tempo e de uma maneira ou de outra, por ser restringida e coarctada.
Por acaso há uma elite bem alapada à democracia representativa e assaz intelectual. É a Elite Estrela. Até escreve livros sobre português em brasileiro.
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Comentar por Bic Laranja (@biclaranja) — Terça-feira, 28 Agosto 2012 @ 4:58 pm |