perspectivas

Terça-feira, 10 Julho 2012

As touradas, a tradição e o progresso

Muita gente se pergunta por que razão, sendo o Bloco de Esquerda um partido político com uma base de apoio social não só pequena mas também concentrada em Lisboa, tem tanta visibilidade nos me®dia.

O progresso é composto por toda a acção ética, social e política que fundamente racionalmente qualquer mudança, com o respeito devido às tradições, e dentro dos parâmetros do psiquismo nacional.

A razão é a seguinte: a super visibilidade do Bloco de Esquerda nos me®dia é fomentada pelas nomenclaturas do Partido Socialista e do Partido Comunista, ou seja, estes dois partidos necessitam da grande visibilidade pública dos sociopatas do Bloco de Esquerda à solta, para esconderem a sua própria sociopatia, ao mesmo tempo que utilizam as ideias radicais do Bloco de Esquerda para fazer avançar as suas próprias agendas políticas, escondidas do povo. E este fenómeno já começa a extrapolar a chamada Esquerda: já entrou no Partido Social Democrata e mesmo no CDS/PP, por exemplo, com o deputado Adolfo Mesquita Nunes.

Portanto, o Bloco de Esquerda é um elemento político de desintegração social apoiado pela esquerda em geral, e por uma parte da direita neoliberal — embora esse apoio seja velado e hipócrita. O Bloco de Esquerda funciona como uma espécie de Bobo da Corte: por um lado, é tolerado e mesmo incentivado, e por outro lado, é criticado hipocritamente pelo seu radicalismo ou pelos seus excessos.

Por exemplo, ainda recentemente, uma deputada do CDS/PP arranjou o seguinte argumento para refutar a pretensão do Bloco de Esquerda em proibir a transmissão das touradas na televisão pública: “há mais pessoas a ver as touradas na televisão do que pessoas que votam no Bloco de Esquerda”.

A utilização deste argumento, por parte do CDS/PP, só demonstra a razão deste verbete, porque bastaria que existisse mais um votante no Bloco de Esquerda do que espectadores das touradas televisionadas, para que o argumento do CDS/PP caísse por terra. O argumento do CDS/PP, neste caso, segue exactamente o modelo de argumentação emocional do Bloco de Esquerda, e entra na falácia lógica ad Populum — o apelo à galeria e à quantidade – adentro, o que significa que o Bloco de Esquerda e o CDS/PP não estão em desacordo na essência, mas apenas na oportunidade e no timing da proibição das touradas. O Bloco de Esquerda acabou por ganhar o debate, mesmo sendo derrotado nas suas pretensões imediatas.

O Bloco de Esquerda é o único partido político português aberta e radicalmente anti-tradição. Não há nem uma tradição portuguesa — repito: nem uma — que o Bloco de Esquerda não combata. Basta que uma manifestação cultural seja produto de uma qualquer tradição para que o Bloco de Esquerda seja automaticamente contra. E é por isso que o Bloco de Esquerda se torna útil a outros partidos, que não assumem publicamente as suas estratégias políticas sociopatas e anti-tradicionalistas, numa ou noutra área.

Aquilo que o Bloco de Esquerda e — por colagem política mais ou menos explicita — os outros partidos nos trazem, é progresso? O que é o progresso?

Na sua esmagadora maioria, a classe dos intelectuais orgânicos portugueses é constituída por gente atrasada e limitada em inteligência.

Todos os partidos políticos portugueses continuam [ainda!] a entender o progresso à luz das ideias de Hegel e de Comte, que entendiam o progresso como uma lei da natureza. Ora, o progresso não é uma lei da natureza: basta uma geração — por exemplo, uma geração bloquista — para dar cabo de um eventual progresso da sociedade. E também pode haver progresso negativo: nem todo o progresso é positivo; por vezes, e de acordo com o espírito do tempo, temos a ideia de uma determinada acção política e/ou social é progressista, mas alguns anos mais tarde verificamos que foi prejudicial à sociedade, e regressiva. E o progresso, a existir, não aponta nunca para uma perfeição ética — porque a perfeição do ser humano é impossível —, mas apenas para uma hierarquização racional da ética. A investigação científica e o investimento na técnica podem não ser sinónimos de progresso. O conceito de progresso é complexo e não pode ser visto da forma simplista como a nossa classe política o vê.

O progresso é composto por toda a acção ética, social e política que fundamente racionalmente qualquer mudança, com o respeito devido às tradições, e dentro dos parâmetros do psiquismo nacional.


« Os puritanos detestavam os combates de ursos, não porque esses jogos causassem sofrimento aos ursos, mas porque davam prazer aos espectadores. » — Thomas B. Macaulay

Por exemplo, a crítica às touradas e a intenção de as proibir — característica do Bloco de Esquerda — tem origem anglo-saxónica, ou seja, tem origem na Inglaterra que legalizou o aborto até às 24 semanas de gravidez, e nos Estados Unidos onde ainda existe o aborto legal praticamente sem limite de tempo de gravidez. A posição do Bloco de Esquerda em relação ao aborto e às touradas transformam-no no partido português culturalmente mais americanizado — o que vai de encontro a um certo puritanismo hipócrita que marca simultaneamente as culturas anglo-saxónica e a do Bloco de Esquerda.

Existe uma certa ideia, na classe política portuguesa, segundo a qual uma tradição quebrada nunca mais volta. Trata-se de um erro. A tradição religiosa foi quebrada com a implantação da URSS e voltou com renovada força na actual Rússia, depois da queda do comunismo. O que faz falta à nossa classe política é olhar para a História.

3 comentários »

  1. Este ponto de vista é genial. Nunca tinha imaginado esta situação deste ponto de vista, que diga-se a verdade, é fulminante. Desfaz quaisquer dúvidas que possam existir. Se até agora a partidocracia era entendida como que um «partido único com cinco secções diferentes», a partir deste momento podemos definir a partidocracia como um “partido único com um catalisador interno para quatro secções diferentes”.

    O catalisador (BE), é o elemento de transposição entre o que não se admite publicamente e o que é, simultaneamente, intimamente desejado. E o desejado, é obviamente aquilo que não se admite publicamente. Ora aqui está a sociedade na sua dissolução final, são os últimos bocejos e debacles do socialismo revolucionário.

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    Comentar por Filipe Crisóstomo (@Skedsen) — Terça-feira, 10 Julho 2012 @ 2:13 pm | Responder

  2. Nem mais, caros Orlando e Filipe!
    Cumpts

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    Comentar por Inspector Jaap — Terça-feira, 10 Julho 2012 @ 3:22 pm | Responder


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